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Problemático, Blonde traz uma Marilyn Monroe ainda mais objetificada

Lançada no último mês, a releitura estrelada por Ana de Armas vem causando revolta nas redes sociais pela visão limitada e até mesmo errada da estrela

Por Da Redação Atualizado em 30 out 2024, 15h29 - Publicado em 10 out 2022, 18h20
Cena de Blonde, filme da Netflix
Cena de Blonde, filme da Netflix Netflix/Reprodução

Blonde, de Andrew Dominik está dando o que falar. O filme que estreou no último dia 28 de setembro na Netflix traz uma única visão – totalmente sob a ótica masculina –  sobre a história de Marilyn Monroe, uma das atrizes a era de ouro de Hollywood que tem sua imagem e carreira exploradas de forma intensa ao longo da História. Com certeza você já ouviu falar nela, né?

Desde a divulgação do primeiro teaser, o público já ficou em alerta com o recorte que o longa poderia trazer sobre a história da diva. E acertaram no ponto: o filme, que é baseado no livro da escritora Joyce Carol Oates, publicado em 2000, traz um enredo que ressalta a objetificação sem trazer à tona a saúde mental e transforma as dores da personagem em um fetiche.

A crítica especializada ressaltou diversos dos pontos abordados no filme e os tópicos se tornaram discussões nas redes sociais, debatendo como a imagem da atriz foi reproduzida no longa.

Parece complexo de entender, né? Existem alguns pontos no filme que deixam essas questões bem claras. A gente te explica.

1. O relacionamento de Norma, nome de batismo de Monroe, com sua mãe esquizofrênica é retratado com complexidades no longa. O que não deixa de ser uma possibilidade, já que, segundo o livro de Oats, a infância dela foi complicada em diversos aspectos. Porém, não há confirmação de que Marilyn foi vítima de um afogamento, provocado por sua própria mãe.

 

2. Outro ponto que só ocorreu na ficção é um possível aborto. É de conhecimento público que Marilyn sempre quis ter filhos e não conseguiu, mas não há confirmação dos motivos que são mostrados no enredo, sendo que vale destacar que atriz também sofria de uma grave endometriose. Já em uma cena do filme, o diretor coloca a atriz conversando com o próprio feto, romantizando a questão.

“Como o cinema e a TV moldam a compreensão de muitas pessoas sobre a saúde sexual e reprodutiva, é fundamental que essas representações retratem com precisão as decisões e experiências reais das mulheres”, disse Caren Spruch, diretora nacional do Planned Parenthood, organização que luta por direitos reprodutivos nos Estados Unidos em uma conversa com o The Hollywood Reporter.

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Ela ainda explicou que respeita licenças artísticas e a liberdade, mas pontuou que mostrar o feto completamente formado conversando com a atriz pode ter um impacto negativo na vida das mulheres.

“Os fanáticos antiaborto há muito contribuem para o estigma do aborto usando descrições medicamente imprecisas de fetos e gravidez. O novo filme de Andrew Dominik, Blonde, reforça sua mensagem com um feto falante de CGI, retratado como um bebê totalmente formado.”

Ela afirmou que as “imagens falsas servem apenas para reforçar a desinformação e perpetuar o estigma em torno dos cuidados de saúde sexual e reprodutiva” e ressaltou que os casos precisam ser retratados “com sensibilidade, autenticidade e precisão na mídia”.

Caren ainda lamentou a forma como tema foi abordado na produção. “Temos muito trabalho a fazer para garantir que todas as pessoas que abortam possam se ver na tela. É uma pena que os criadores de Blonde tenham escolhido contribuir para a propaganda antiaborto e estigmatizar as decisões de saúde das pessoas.”

Em uma conversa com o site The Wrap, Andrew Dominik explicou que acredita que “tudo envolvendo Marilyn Monroe é meio que uma fantasia de resgate”. Ele também respondeu aos comentários que acusavam o enredo de fazer propaganda antiaborto. “O que o filme está dizendo é que ela não está vendo a realidade. Ela está vendo seus próprios medos e desejos projetados no mundo ao seu redor.”

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“Você vê constantemente que ela está reagindo a uma história que ela está carregando dentro dela. E eu acho que esse desejo de olhar para Blonde através dessa lente Roe vs. Wade é todo mundo fazendo a mesma coisa. Eles têm um certo assunto em que sentem que a liberdade das mulheres está sendo comprometida, e eles olham para Blonde e veem um demônio, mas não é realmente sobre isso”, disse ao trazer para seu discurso a revogação do direito ao aborto feita pela Suprema Corte dos Estados Unidos em junho deste ano.

O diretor finalizou declarando que “ninguém teria se importado com isso se o filme tivesse sido feito em 2008” e que “provavelmente não vão se importar daqui 4 anos”, mas que não acredita que o filme tenha propaganda antiaborto. “Acho que o filme tem bastante nuances, na verdade, e acho muito complexo, mas isso não se encaixa – as pessoas estão obviamente preocupadas com a perda de liberdades, obviamente estão.”

3. A atuação da Ana de Armas, que é colombiana, trouxe uma onda de xenofobia, principalmente por conta do sotaque da atriz. “Eu sempre achava que estava fazendo algo errado. Eu ficava me perguntando, ‘o que esses atores americanos estão pensando de mim? O que eles estão pensando sobre o meu sotaque?”, comentou ela à AnOther Magazine.

Brad Pitt, dono da produtora do filme, a Plan B, defendeu e elogiou o trabalho da atriz em entrevista ao programa “Entertainment Tonight”, na TV aberta dos Estados Unidos. “Ela está fenomenal no papel”, disse. “É algo difícil de preencher. Foram 10 anos de preparação. Foi só quando encontramos Ana que conseguimos cruzar a linha de chegada”, pontuou.

4. Outra questão é a forma como o envolvimento de Marilyn e o presidente JFK foi retratado na trama. Este talvez seja um dos grandes mistérios de Hollywood. Embora amigos da atriz tenham relatado que os dois realmente tiveram um encontro casual, não há nenhum fato que comprove os rumores que surgem sobre este assunto – incluindo o abuso retratado em Blonde.

Sobre o eventual relacionamento dela com Charlie Chaplin Jr. e Edward G. Robinson Jr., os três realmente trabalharam juntos em Quanto Mais Quente Melhor – mas não há evidências do “trisal” que é mostrado no filme. Só se sabe que Charlie disse em sua autobiografia que namorou com a atriz por um tempo, enquanto Edward e a Marilyn eram apenas amigos.

Juntando todos essas questões às discussões nas redes sociais, a gente consegue perceber que a história de Marilyn gera uma disputa de narrativa, né? Isso significa que sua fama e o espaço que ela conquistou em Hollywood na época foi tão forte que até hoje diretores, pesquisadores e escritores tentam entender quem foi essa figura, em um lugar de mistério, fantasia, sob o olhar masculino, não sob os olhos e perspectiva dela própria.

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