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Blog da Galera: Louie Ponto fala sobre vivências como lésbica e aceitação

Paula Neiman, da Galera CH, conversou com a YouTuber sobre diversos temas. Confira!

Por Da Redação 17 jun 2019, 17h21

Oi, galera! Tudo certo? Aqui é a Paula Neiman. Estamos no mês do orgulho LGBTQ+ e, por isso, decidi conversar com a Louie Ponto, um dos maiores nomes do YouTube brasileiro na comunidade. Ela me contou várias vivências, processos de autoaceitação, como foi se assumir para a família, a polêmica do “pink money”, vegetarianismo e o match perfeito.

Instagram/Reprodução

Nós também gostaríamos de convidar vocês para assistirem a transmissão ao vivo da parada LGBT de São Paulo, que acontecerá no dia 23 de junho, no canal da Louie Ponto. Confira a entrevista:

Paula: Como foi o seu processo de aceitação?
Louie: Acredito que o processo de autoaceitação é muito individual e, no meu caso, foi um processo bem longo. Muito cedo percebi que gostava de meninas, por isso pensava que tinha alguma coisa errada comigo. Eu “saí do armário” muito cedo, aos 14 anos, então era muito nova quando passei por situações muito delicadas. Comecei a me entender e a me aceitar depois que entrei na faculdade. Tive o privilégio de ter acesso à educação e de fazer um curso que me colocou em contato com discussões sobre sexualidade e gênero. Isso contribuiu pra que, aos poucos, eu desconstruísse os preconceitos que já tinha internalizado.

Paula: Como foi para você se assumir para a família? O que você diria para as pessoas que estão passando pela mesma situação?
Louie:
Por ter “saído do armário” pela primeira vez aos 14 anos, antes mesmo de entender o que estava acontecendo comigo, não foi uma boa experiência passar por tudo isso tão cedo. Eu não tinha condições emocionais e argumentativas para debater, para defender o que eu sentia ou para me defender de comentários preconceituosos. Eu não costumo responder quando me perguntam sobre o momento certo de se assumir porque isso é muito subjetivo, ou seja, é diferente pra cada pessoa: cada ser humano vive num contexto diferente e não existe um tempo ou um jeito certo de “sair do armário”. Eu costumo responder que você precisa conhecer sua realidade, sua família, e perceber se pode falar ou não. Se você vive com pessoas muito LGBTfóbicas, por exemplo, talvez seja melhor esperar para quando tiver uma independência financeira, evitando o risco de passar por alguma situação de vulnerabilidade.

Paula: O que você pretende representar dentro da comunidade LGBTQ+?
Louie:
Eu acho que meu objetivo não é representar ninguém, afinal, isso é muito difícil porque cada ser humano vive uma realidade diferente. Eu, por exemplo, não posso representar nem mesmo todas as mulheres lésbicas. Eu tenho uma realidade especifica: sou uma mulher branca, de classe média, que hoje tem o privilégio de falar abertamente sobre a própria sexualidade. Não acho que seja uma questão de representar outras pessoas, e sim de dar visibilidade a vivências que fogem da norma, a histórias que, como a minha, sempre foram apagadas de todos os espaços.

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eu e minha caneca amarela (agora destruída por lisa) passando pela sua timeline pra avisar que amanhã tem vídeo novo às 19h. sei que os vídeos costumam sair na quarta, mas tô pensando em mudar pra segunda e por isso tô fazendo um teste em fevereiro. é sempre difícil escolher dia e hora pra soltar os vídeos, então aceito opiniões, por favor! ✨

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Paula: Há quanto tempo você é vegetariana? Por que você decidiu ser? O que você diria para as pessoas que estão querendo iniciar esse processo?
Louie:
Sabe que eu nunca sei responder há quanto tempo sou vegetariana? Desde muito cedo eu comecei o processo de parar de comer carne, mas acredito que tenha parado completamente há uns cinco anos. Já na infância eu pensava que não era certo comer animais e vivi algumas experiências que me fizeram questionar a relação que estabelecemos com os animais. O problema é que achava que a carne era algo fundamental na nossa alimentação, porque é o que aprendemos, mas depois que descobri que existiam pessoas vegetarianas, eu soube que um dia seria também. Tudo começou por causa dos animais, mas depois passei a pesquisar sobre o assunto e percebi que muitas coisas, envolve uma situação social, os impactos ambientais, entre outros malefícios. A transição é um processo muito individual, mas uma dica é: antes de cortar, incluir. Inclua frutas, verduras e grãos primeiro na sua alimentação e, depois sim, retire a carne.

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Paula: Você tem músicas autorais postadas no seu canal. Pretende lançar um álbum? Quais são seus planos dentro da música?
Louie:
Eu comecei meu canal por causa da música em 2008, quando o YouTube era uma rede social como qualquer outra. Como eu sou muito tímida, decidi fazer os vídeos para desenvolver esse meu lado e postar minhas composições, assim eu poderia mandá-las para as pessoas conhecidas já que nunca tocava na frente delas. O YouTube não tinha tantos conteúdos naquela época, então os canais cresciam com mais facilidade, por isso comecei a receber várias perguntas: algumas preconceituosas, outras de pessoas que buscavam identificação e queriam saber sobre minha sexualidade, sobre as roupas que eu usava, sobre meu cabelo curto. Eu decidi gravar um vídeo sobre isso e não parei mais… Aos poucos, parei de gravar vídeos de música. Então, eu abandonei um pouco a música, mas tenho retomado isso ultimamente. Estou escrevendo de novo, tenho vontade de lançar um EP… Não são planos concretos, mas é uma vontade que sempre tive.

Paula: Quando você começou com o canal, tinha a pretensão de inspirar tantas pessoas a serem elas mesmas?
Louie:
Nunca imaginei que isso poderia acontecer! Eu criei o canal como se fosse qualquer outra rede social. Tinha 17 anos, estava no início de um processo de autoaceitação e o canal foi muito importante para mim nesse sentido. Eu vejo que me desconstruí e me reconstruí a partir do canal, sabe? Percebi que não estava sozinha e construí uma rede de apoio, o que eu acho muito lindo! Nada foi planejado, tudo foi acontecendo naturalmente. Hoje percebo o impacto desse trabalho e isso é incrível, mas no início eu nem pensava que poderia ajudar alguém, afinal, quem precisava de ajuda era eu. E eu acabei conseguindo isso com o canal, porque sempre houve uma troca entre mim e as pessoas que acompanham meu trabalho.

Paula: Você tem alguma exigência para rolar o ”match” perfeito? Tipo, ter um mapa astral parecido com o seu, gostar de gatos ou cozinhar.
Louie:
Eu acho que precisa gostar de gatos, afinal, eu tenho cinco! Se a pessoa não gostar, fica difícil o relacionamento! (risos). Eu não acredito muito nessa ideia de que os opostos se atraem porque, pra mim, precisa existir uma compatibilidade. Eu sou uma pessoa muito caseira, por exemplo, gosto de ficar em casa vendo filme, ouvindo música, cozinhando, brincando com os meus gatos, então eu procuro alguém que goste dessas mesmas coisas. Tirando isso, acho que não tenho outras “exigências”. É mais uma questão de personalidade e de algumas coisas que eu valorizo nos seres humanos. Acho importante me relacionar com alguém que tenha os mesmos ideais que eu, que se preocupa com as mesmas coisas e que tenha as mesmas prioridades. Ah! Precisa gostar de crianças também, porque tenho dois afilhados e eles são os amores da minha vida, então é isso: tem que gostar de gatos e de crianças (risos).

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Paula: Qual seu maior sonho?
Louie:
Eu acho muito difícil responder isso porque eu não crio muitas expectativas sobre o futuro. Eu sempre tive expectativas e vontades que algumas pessoas consideram simples, mas que pra mim são minha prioridade: viver perto das pessoas que eu amo, da minha família, trabalhar com algo que encha meus olhos de felicidade, sentir que minha existência vale a pena por algum motivo. Quero ter a sensação de que a minha passagem por esse mundo vai ter algum impacto positivo.

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mais harry potter que eu? | 📷 @micaelatorresfotografia

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Paula: Como você se sente sendo um dos maiores nomes do Youtube brasileiro quando se trata da comunidade LGBTQ+? Você sempre teve essa pretensão?
Louie:
Eu não sei! Eu não penso muito que isso seja verdade, é até estranho responder essa pergunta (risos). Eu sempre me surpreendo com tudo que acontece, quando dou entrevista, quando alguém que eu admiro compartilha meu trabalho, acho que sempre vou achar estranho porque eu nunca tive essa pretensão, nunca achei que esse seria meu trabalho. Eu só posso dizer que sou muito grata e que, de certa forma, foi o que eu respondi sobre meu maior sonho: sentir que a minha existência nesse mundo faz alguma diferença. Quando eu era mais nova, sentia falta de ter alguém em quem me inspirar, ter uma referência positiva, e ser uma boa referência para alguém, para mim, é como se tivesse valido a pena ter passado por todas as violências que eu passei, todo o bullying na escola, tudo valeu a pena porque hoje eu estou aqui.

Paula: O que você pensa sobre a sexualização das mulheres lésbicas?
Louie:
Eu penso que mulheres são sexualizadas desde muito cedo, desde a infância, e a gente percebe isso em muitas aspectos da sociedade – os casos de abuso e assédio, a indústria pornográfica que vende os corpos das mulheres, as propagandas destinadas principalmente ao público masculino, como as de cerveja. Essa sexualização atinge as mulheres lésbicas e se manifesta de diversas formas, como a fetichização dos nossos relacionamentos, por exemplo. O corpo das mulheres sempre foi considerado um corpo sem autonomia, criado para oferecer prazer, e, se uma mulher é feita para isso, duas mulheres seriam o ápice do fetiche masculino. A própria indústria pornográfica vende esta imagem! Mas isso não nos torna mais aceitas, muito pelo contrário: a fetichização e a sexualização da nossa existência e dos nossos relacionamentos é só mais uma violência contra as mulheres lésbicas.

Paula: Quem foi sua maior inspiração na época em que você estava se descobrindo? Alguém que você se sentia representada?
Louie:
É muito triste dizer isso, mas não consigo pensar em ninguém. Quando eu era criança já me sentia diferente porque não tinha nenhuma referência. E mesmo depois, quando estava começando a questionar minha sexualidade, com 12 ou 13, ou ainda depois, quando comecei a me relacionar com outras meninas, não consigo me lembrar de nenhuma referência lésbica positiva. Claro que mulheres lésbicas e bissexuais sempre existiram, inclusive mulheres famosas, mas essa sempre foi uma questão muito pouco discutida. Em nenhum espaço essas vivências eram expostas ou apresentadas de forma positiva, a internet era escassa, muito diferente do que é agora. Hoje tem muitas mulheres se assumindo, falando sobre seus relacionamentos e, mesmo agora, que sou adulta, isso é importante para me dar força e coragem, mas quando eu era mais nova senti falta dessa representatividade.

Paula: O que você pensa sobre artistas que se dizem parte integrante da comunidade LGBTQ+, mas nunca aparecem com alguém do mesmo gênero? Acha que o “pink money” é válido de alguma forma?
Louie:
Acho importante a gente ter consciência de que não vai ser um relacionamento que vai validar a sua orientação sexual, sabe? Você pode passar a vida inteira sem se relacionar com ninguém, por exemplo, e isso não vai mudar a forma como você se identifica. As pessoas falam muito sobre a sexualidade das outras, mas só elas mesmas poderão dizer como se identificam. É inegável que existe a questão do pink money e muitos artistas utilizam as pautas LGBTQ+ para conseguir visibilidade e dinheiro mesmo, sobretudo aqueles que se dizem aliados e mesmo assim tem atitudes LGBTfóbicas, apoiam políticos LGBTfóbicos e não fazem nada de concreto para contribuir com nossa luta. A gente precisa ter essa consciência politica e prestar atenção nas atitudes dos artistas – perceber se existe uma coerência entre o que dizem e o que fazem, procurar saber o que eles fazem de concreto pela causa LGBTQ+. Assim, a gente vai saber quem de fato tem compromisso com uma mudança social.

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todo dia uma foto igual no mesmo espelho sujo do meu quarto (dessa vez são duas fotos iguais)

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Paula: Como você lida com a pressão estética?
Louie: Eu costumo pensar que existe um padrão estético e um padrão de feminilidade. Eu sei que não passei por muitas violências que sofrem as mulheres que não se encaixam no padrão estético. Eu me encaixo nesse padrão em muitos aspectos porque sou branca, magra e, mesmo que não performe feminilidade, eu sou considerada fofa e delicada, e isso faz com que seja mais aceita em lugares públicos, inclusive por parte de pessoas LGBTfóbicas. Em relação ao padrão de feminilidade, é diferente: essa sempre foi uma questão para mim. Nunca correspondi a esse modelo, por causa das roupas e das atividades que eu gostava, enfim, sempre sofri bullying e preconceito por causa disso e até hoje eu tenho muitos problemas de autoestima por causa dos impactos dessa vivência. Agora eu tenho muito mais segurança, consigo me achar bonita, mas foi difícil por muito tempo. Eu ouvi muitas coisas, sofri preconceito na escola, na rua, e isso que eu ainda tenho muitos símbolos de feminilidade. Há mulheres que fogem muito mais dos padrões de feminilidade e sofrem ainda mais preconceito.

Paula: Como você lida com comentários LGBTfóbicos e preconceituosos? O que você diria para outras pessoas que trabalham com mídia digital e passam por preconceitos na internet?
Louie:
Infelizmente a gente se acostuma com algumas coisas. A gente não deveria se acostumar com nenhum tipo de violência, mas é um mecanismo de sobrevivência, é um modo que a gente encontra de continuar. A gente encontra ferramentas para lidar com isso, mas essas violências deixam muitas marcas. O que eu passo na internet é uma reprodução do que eu já passava antes, só que em uma proporção diferente, muito maior. Eu sempre ouvi comentários preconceituosos, eu lido com isso desde criança, então, quando eu sofro violência LGBTfóbica na internet, eu meio que já sei como lidar. Quando pessoas chegam no meu canal com pensamentos preconceituosos, mas abertas ao diálogo, eu fico feliz, mesmo que o comentário seja ofensivo, porque eu acredito no diálogo, na educação, e acho que a partir do debate a gente pode desconstruir preconceitos. Mas existe uma diferença entre as pessoas que estão dispostas ao diálogo e as pessoas que só estão ali querendo agredir. Ano passado, por exemplo, fui alvo de muita violência na época das eleições e isso me dá medo, mas essa violência nunca se materializou de forma física. Sempre foi uma violência simbólica, psicológica e digital, o que não deixa de ser horrível. A gente precisa construir uma casca muito dura para conseguir lidar com isso. Eu estou aprendendo a construir essa casca agora… A internet me levou a terapia. (risos) É muito difícil lidar com a exposição, mas o que eu diria para outras pessoas LGBTQ+ que trabalham com internet é que também façam terapia, porque nós somos pessoas que já temos muitas fragilidades, que passamos por inúmeras situações de violência ao longo da vida e, às vezes, a internet pode ser um gatilho diário pra essas feridas, então procure seus amigos, converse com outras pessoas que passam por isso, procure apoio.

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a pessoa com a brusinha dobrada não quer guerra com ninguém | 📷 @coelhothali

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Quero agradecer a Louie por aceitar dar essa entrevista, obrigada por ajudar as pessoas e ser uma voz para tantas mulheres. Espero que vocês tenham gostado da entrevista e que tenha ajudado vocês. #HappyPrideMonth

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Beijinhos,
@paula_neiman

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