Olhe bem para a Amazônia antes de votar nas eleições de 2022

Apesar de parecer distante, o desmatamento da Amazônia tem um impacto direto na nossa vida cotidiana, sabia?

Por Marcela de Mingo, para a Capricho Atualizado em 30 out 2024, 15h48 - Publicado em 5 jul 2022, 06h00
Amazônia
Segundo o Imazon, o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, só ano passado foram desmatados mais de 10.300 quilômetros de mata nativa – o equivalente a metade do tamanho do estado de Sergipe. Getty Images/Getty Images

Se tem um assunto sobre o qual a gente ouve falar com frequência, esse assunto é a questão ambiental. Entre notícias apocalípticas sobre o aumento das temperaturas do planeta e dos desastres climáticos – temas esses de abrangência global – nos vemos no meio de uma discussão sobre a proteção da Amazônia e as brigas por mais terrenos de plantio e pasto aqui no Brasil. Só que, no meio de toda essa conversa, fica a pergunta: o que diabos isso tem a ver com as eleições desse ano?

E a resposta é simples: TUDO. Pegando o exemplo da Amazônia, é fácil perceber como o desmatamento da floresta, que ocupa boa parte dos estados do Norte do país, anda de mãos dadas com uma série de problemas sociais e econômicos, como violência, pobreza e corrupção.

“Nunca é só uma árvore caindo, é uma agressão, uma morte da natureza”, explica Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima. “Quem provoca o desmatamento provoca todas as outras situações.”

Ou seja, quando falamos em “questão ambiental”, falamos tanto do cenário global, em que nós, como humanidade, mexemos nos mecanismos de funcionamento do planeta (por exemplo, o aumento da temperatura dos oceanos), quanto das questões locais relacionadas à fauna e à flora brasileiras.

“Aqui, temos um problema específico, que é o desmatamento, que muda a rotina do clima no Brasil e é o maior fator de contribuição do país para o problema global – cerca de 45% das nossas emissões de gás carbônico hoje vem do desmatamento”, continua.

Para a gente ter uma ideia da dimensão disso tudo, a floresta amazônica viveu, em 2021, o seu pior ano em uma década. Segundo o Imazon, o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, só ano passado foram desmatados mais de 10.300 quilômetros de mata nativa – o equivalente a metade do tamanho do estado de Sergipe. Em relação ao ano anterior, 2020, a devastação foi 29% maior.

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A questão ambiental X A questão sócio-econômica

Amazonia

Citamos em alguns parágrafos acima que a devastação da Amazônia anda de mãos dadas com muitos problemas sociais e econômicos que vemos no país, certo? É aí que entra a sua importância política.

Se pensarmos no tamanho da área total da Amazônia – com seus mais de seis milhões e 200 mil quilômetros de extensão – em relação ao tamanho do Brasil, com mais de oito milhões e 500 mil quilômetros, temos que mais da metade do país é vítima de crimes diariamente.

São crimes de desmatamento, de pesca e caça ilegal, garimpo ilegal, etnocídio (ou seja, a destruição das populações indígenas), tráfico de drogas e de pessoas, prostituição infantil… Ixi, a lista (infelizmente) é bem longa.

É como se a Amazônia fosse uma grande prestadora de serviços para várias situações que a gente depende para sobreviver

Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima
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E, ao falarmos da Amazônia, parece que estamos falando de um pedaço de terra bem longe da gente, né? Ainda mais se você vive num grande centro urbano, como São Paulo ou Rio de Janeiro. Mas, acredite, a questão ambiental brasileira interfere diretamente no seu dia a dia – ela está muito mais próxima do que você imagina.

“Quando você liga a luz na sua casa, tem um pouco de Amazônia, porque a luz é gerada por hidroelétricas e grande parte das chuvas que vão fazer as turbinas dessas hidroelétricas girarem acontece graças à Amazônia”, explica Marcio.

“Quando você faz um prato de comida, esse prato só existe por causa da Amazônia: essas mesmas chuvas irrigam o plantio de alimentos no Brasil de forma continuada, na quantidade certa, no período correto. É como se a Amazônia fosse uma grande prestadora de serviços para várias situações que a gente depende para sobreviver.”

A partir dessa visão, fica mais fácil entender porque a nossa vida sofre um impacto todas as vezes que a Amazônia é agredida. Se a destruição total da floresta finalmente acontecer, o país vai ter mais dificuldades de produzir alimentos em grandes quantidades.

A conta de luz também vai aumentar porque, quando as chuvas estão escassas (e a gente é tarifado segundo a famosa “bandeira vermelha”), os operadores das hidroelétricas ligam as térmicas a gás e a carvão – que além de mais poluentes, tornam a energia mais cara.

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“Proteger o meio ambiente, no caso do brasileiro, tem a ver com a nossa vida cotidiana”, reflete.

Outra forma de entender de que maneira essa questão interfere no cotidiano e nos problemas sociais e econômicos do Brasil é fazendo um paralelo com a pandemia de coronavírus. Como um dos efeitos da gestão pandêmica, vemos que as pessoas mais pobres estão ainda mais pobres e, pior, o número de pessoas passando fome por aqui explodiu: segundo o 2.º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19 no Brasil, mais de 33,1 milhões de pessoas estão passando fome por aqui – o mesmo patamar de 30 anos atrás.

A qualidade de vida cai para todo mundo, mas quem sofre primeiro são as pessoas menos privilegiadas e com menos acesso a tudo: informação, trabalho, medicamentos, alimentos, moradia, saneamento básico…

“Quando você vê uma pessoa fugindo da seca no Nordeste brasileiro, ela não foge de BMW e se muda para uma mansão em São Paulo”, continua Marcio. “Quando a gente fala de desastre ambiental, os primeiros impactados vão ser sempre os mais pobres. Teve desastre ambiental, você sempre vai ver a população mais necessitada sofrendo mais – e, normalmente, os negros e as mulheres. É o recorte que mais sofre com tudo isso.”

Mas o que a gente faz diante desse cenário catastrófico? 

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Getty Images/Getty Images
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Bateu um desespero aí? Pois é, aqui também. Por isso, cuidar da questão ambiental é cuidar da gente também. Se, hoje, a gente abolir o desmatamento da Amazônia e salvar a floresta, dificilmente vamos resolver a questão da fome no mundo – mas se isso não acontecer, a gente vai estar, literalmente, jogando mais lenha na fogueira.

“É sempre uma batalha para não tornar pior o que já está ruim – e não piorar o que já está ruim para nós mesmos. Essa é uma conversa que diz respeito a nós: como a gente vai viver nesse único planeta em que a gente conseguiu se estabelecer”, diz.

É aí que entra – você acertou! – o seu poder de voto. Escolher candidatos que pensem no bem-estar ambiental como uma prioridade é essencial se a gente quer melhorar o nosso presente e o nosso futuro.

O como você já sabe: votar consciente é importantíssimo quando a gente fala em questão ambiental. Para isso, vale a pena analisar a pauta dos candidatos – principalmente senadores e deputados – e entender quais são as propostas e considerações dessas pessoas a respeito do meio ambiente.

Mais do que isso, vale a pena também compreender o histórico dessas pessoas a respeito do assunto. Afinal, não é incomum vermos por aí pessoas que vendem promessas apenas em troca de votos. Um candidato comprometido com uma pauta é aquele que demonstrou, através das suas ações, o seu compromisso com essa pauta – engajando na causa ambiental nas redes sociais, participando de eventos sobre o assunto e, principalmente, propondo projetos de proteção ambiental e buscando barrar aqueles que estimulam a destruição da natureza.

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“Os jovens recebem muita campanha sobre as suas atitudes diárias, reciclar, economizar, não consumir mais do que o necessário, ter atitudes positivas e responsáveis”, esclarece Marcio. “O voto é também uma forma de reciclagem. No momento, tem muito lixo em Brasília que precisa ser reciclado, e eles têm como se informar em todas as plataformas. É preciso pesquisar quais são os compromissos dos candidatos para o meio ambiente, porque essa coisa de ‘eu sou a favor’ não basta.”

Dá para a gente pensar sobre essa matemática de outra forma: a escolha que você faz sobre onde vai jogar uma lata de alumínio é importante, mas a sua escolha política é mais importante do que todas essas pequenas escolhas juntas. É um dia de voto para quatro anos de resultado. “Se não for bem-feita, você vai ficar 4 anos assistindo o candidato sendo o próprio lixo que precisa ser descartado”, diz o secretário executivo.

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AMAZON RAINFOREST, ACRE STATE, BRAZIL – 2017/05/03: Aerial view of Amazon rainforest deforestation and farm management for livestock. Acre State, Brazil. (Photo by Ricardo Funari/Brazil Photos/LightRocket via Getty Images) Getty Images/Getty Images

Ou seja, é melhor escolher bem do que tentar remediar a escolha depois. A agenda ambiental é uma agenda coletiva, que vai muito além só das nossas necessidades como indivíduo. Buscar candidatos que vejam esse assunto dessa forma também é importante, afinal, não dá para esquecer que são os menos privilegiados que vão sofrer primeiro com as consequências dessa agenda, né?

O seu voto importa. E as suas ações também. Manter isso em mente é parte do processo de transformação que o mundo precisa para brecar o que, hoje, parece inevitável. E, se faltar motivação, vale olhar para trás e ver como, muitas vezes, a mudança aconteceu a partir de um pequeno grupo que fez questão de lutar.

“A nossa dose de persistência e esperança vai romper essa onda desfavorável de muita gente dizendo ‘você não vai mudar nada sozinho’. Isso é besteira. A história mostra que quando a gente se mobiliza está provocando uma transformação. Invista nessa persistência e esperança, olhe para trás e perceba que essa barreira do difícil foi superada e o resultado é gratificante.”

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