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Entenda os pontos-chave da crise humanitária que afeta o povo Yanomami

Quem está por trás do etnocídio Yanomami, quais são as principais ameaças da população indígena, e por que e como a situação fugiu do controle

Por Isabella Otto Atualizado em 29 out 2024, 19h02 - Publicado em 23 jan 2023, 11h06
Entenda os pontos-chave da crise humanitária que afeta o povo Yanomami
Crise humanitária atinge os povos indígenas em região Yanomami – e não é de hoje, viu? URIHI/Divulgação

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) viajou no último sábado (21) para Roraima, se encontrou com lideranças indígenas e do Ministério da Saúde para prestar solidariedade e acompanhar o estado de emergência em saúde pública nas Terras Yanomami (TI), decretado pelo governo federal na última semana. E olha só: para entender a gravidade da situação, vale lembrar que a última vez que um decreto desse tipo aconteceu foi em 2020, quando a pandemia chegou por aqui.

Cerca de 40% da população Yanomami teve diagnóstico confirmado de malária em 2022. As informações são do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami, vinculado ao Ministério da Saúde. Mas hoje a situação se agravou e a desnutrição e outras doenças estão chegando aos povos da floresta, que estão vulneráveis e sem cuidados especializados.

Sônia Guajajara, ministra dos Povos Originários, explicou que a situação é de calamidade total, com indígenas morrendo de “mortes evitáveis”, como desnutrição, diarreia e malária. Nos últimos quatro anos, estima-se que 570 crianças tenham ido a óbito por uma dessas razões, viu?

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Mas como as coisas chegaram até esse ponto? Quais são as ameaças e porque a situação saiu do controle? A CAPRICHO explica os principais pontos para você entender a gravidade da questão – e aqui você pode ver como ajudar.

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1. A omissão do governo Bolsonaro

Líderes do povo Yanomami relataram que, nos últimos quatro anos, fizeram uma série de denúncias ao Governo Federal sobre o avanço do garimpo ilegal em terras protegidas e sobre a falta de assistência médica na região. O esforço, contudo, foi em vão, porque os pedidos de ajuda foram ignorados pela gestão de Jair Bolsonaro (PL).

Crianças yanomamis desnutridas
Crianças yanomamis desnutridas Condisi/YY/Divulgação

Em agosto de 2022, a atual ministra dos Povos Originários deu uma declaração que resumo bem o que a omissão acarretou: “Teria sido melhor se Bolsonaro nos esquecesse, em vez de ficar trabalhando contra nós”, disse Guajajara durante campanha eleitoral. Na época, Sonia concorria para ser Deputada Federal por São Paulo, pelo PSOL.

Isso porque a ida de profissionais da saúde às aldeias Yanomami foi bloqueada por garimpeiros nos últimos anos, que assumiram o controle de polos de saúde e de pistas de pouso, segundo informações de representantes dos povos indígenas. Atualmente, os profissionais de saúde precisam se deslocar de avião para conseguir atender à população. Uma tarefa nada fácil, já que eles estão espalhados por 371 aldeias isoladas e de difícil acesso na floresta.

A negligência do governo para com essa parcela significativa da população é entendida por alguns estudiosos e ativistas como uma tentativa de apagamento. Por isso que tantas pessoas falam em um “genocídio organizado”. Bolsonaro, quando questionado pela ONU (Organização das Nações Unidas) enviou cartas dizendo que a população Yanomami estava recebendo a devida atenção. A notícia foi dado pelo jornalista Jamil Chade, em sua coluna do UOL.

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2. O garimpo ilegal na região Norte

Terra é o principal problema do Brasil. A disputa por territórios motiva práticas como o desmatamento, a pastagem e o garimpo ilegal, uma das principais ameaças do povo Yanomami.

Nos últimos 10 anos, cerca de 80% das mortes por conflito no campo ocorreram na Amazônia, segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra. Indígenas tornam-se refém em sua própria casa e precisam viver em estado de alerta para defender um território que, em teoria, é protegido.

Mina improvisada no centro da Amazônia, em 2007
Mina improvisada no centro da Amazônia, em 2007 Susan Schulman/Exclusive/Getty Images

Além dos ataques dos invasores, que inclui sequestros de crianças e episódios de estupro, os garimpeiros ilegais são responsável por trazer doenças para dentro das comunidades, o que explica o surto de malária que dizima boa parte do povo Yanomami. Em 2022, foram mais de 11 mil casos registrados.

Fora a poluição ambiental que o garimpo ilegal causa, que impacta diretamente a saúde dos animais e, consequentemente, a saúde humana. De acordo com laudos da Polícia Federal, os quatro rios principais da Terra Indígena Yanomami estão com uma contaminação por mercúrio 8.600% maior que o indicado para consumo humano.

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É seguro dizer que os yanomamis já nascem contaminados. Paulo Basta, cientista da Fiocruz, contou ao The Intercept Brasil que “o cérebro de fetos Yanomami tem sete vezes mais mercúrio de garimpo que o de adultos”.

E ele explica: “O garimpo é um agente de sedentarização da população. Ao provocar o escasseamento das fontes naturais, cria uma relação de dependência, provoca mudanças no padrão alimentar e introduz doenças que não existiam, porque o ambiente fica mais contaminado por vírus, bactérias e parasitas”..

A omissão diante dos pedidos de socorro do governo Bolsonaro somados à falta de fiscalização na região não só contribuíram para o avanço do garimpo ilegal, como compactuaram com a crise humanitária que hoje acompanhamos.

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3. A pandemia de Covid-19

Em 2020, a pandemia de Covid-19 estourou no Brasil e invasores trouxeram o coronavírus para dentro das terras indígenas que, afastadas e sem assistência médica, viveram um cenário de caos.

“Enquanto o Brasil e o resto do mundo pararam, mantendo somente as atividades essenciais, os garimpeiros não fizeram quarentena”, denunciou a antropóloga Ana Maria Machado ao site Brasil de Fato, em fevereiro de 2021.

Povo Yanomami recebe visita de médicos do SUS durante a pandemia de Covid-19
Povo Yanomami recebe visita de médicos do SUS durante a pandemia de Covid-19 Andressa Anholete/Getty Images

4. O apagamento dos povos originários

Todas essas questões – que se agravaram nos últimos anos, mas que existem há séculos e são resquícios da colonização – contribuem para uma tentativa de apagamento dos povos orignários do Brasil, que desde o início da chegada dos portugueses lutam pela sobrevivência de sua cultura e território.

Quando hoje fazemos comentários do tipo “nossa, mas esses indígenas nem são mais de verdade” ou “onde já se viu, indígena usando celular?”, também estamos trabalhando em prol desse apagamento – mesmo que não diretamente ou conscientemente. Esses comentários contribuem para a marginalização dos povos originários.

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É comum ouvir por aí que os “índios perderam sua essência” porque possuem aparelhos eletrônicos, como celulares, ou então que “eles só se lembram que são índios quando querem aparecer”. O primeiro erro dessas frases está na palavra “índio”, que caiu em desuso justamente por resumir os vários povos que existem no Brasil em uma só figura. Por isso, hoje, utiliza-se a palavra indígena.

Além disso, há comunidades que estão mais desenvolvidas, mas que continuam sendo indígenas. Afinal, por que elas não podem acompanhar a evolução no mundo e por quais razões elas deixariam de ser indígenas por isso? Todavia, há ainda comunidades mais tradicionais, que moram em áreas mais afastadas e não têm acesso à energia elétrica ou à rede de internet.

Estima-se que existam cerca de 900 mil indígenas, divididos entre aproximadamente 300 povos, segundo o Censo do IBGE de 2010. Achar que “índio” é tudo igual é desmerecer culturas, costumes e vivências, e contribuir, mesmo que indiretamente, para o desaparecimento desses povos.

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