#StopAsianHate: movimento pede fim aos ataques de ódio contra asiáticos
Apesar do aumento de ataques contra asiáticos por conta da pandemia de Covid-19, é importante lembrar que o racismo não surgiu agora
Pouco mais de um ano desde que foi confirmado o primeiro caso de Covid-19 nos Estados Unidos, o número de crimes de ódio (quando o crime é direcionado a uma minoria social, não atingindo apenas uma pessoa específica), contra asiáticos tem aumentado. De acordo com relatório de incidentes de ódio – pois nem toda ação pode ser enquadrada como um crime – contra a comunidade asiática-americana e das Ilhas Pacíficas, foram registrados 3.795 casos entre março de 2020 até fevereiro de 2021, de acordo com o Stop APPI Hate.
Os incidentes de ódio contra mulheres representam 68% das denúncias, sendo quase 2,3 vezes maior que os contra homens, que são 29%. No dia 17 deste mês, 8 pessoas foram mortas em uma área de massagem em Atlanta por um atirador que está preso, e 6 eram mulheres com ascendência asiática. Apesar do motivo do crime não estar confirmado, isso reacendeu a discussão sobre crimes contra asiáticos americanos, principalmente mulheres.
No último final de semana, aconteceram protestos do movimento #StopAsianHate em algumas cidades dos Estados Unidos por conta do ocorrido em Atlanta e pelo aumento de crimes de ódio. Durante a manifestação na cidade de Diamond Bar, na Califórnia, um homem branco ultrapassou o sinal vermelho e quase atropelou os protestantes. Ele também gritou ofensas e está se investigando se cometeu um crime de ódio. Em Berkeley e em Oakland, estão previstas marchas para este domingo (28), e para a próxima sexta-feira (2), respectivamente. Nas redes sociais, o movimento #StopAsianHate também tem gerado repercussão.
A associação do vírus Covid-19 com asiáticos tem contribuído para os ataques nos Estados Unidos. O ex-presidente Donald Trump reforçou esse discurso ao se referir ao vírus como China Virus e Kung Flu. A desinformação a respeito da origem da doença, também está ligada aos ataques. O grupo étnico mais afetado são os chineses, com 42,2% dos incidentes, de acordo com o relatório da Stop APPI Hate.
Apesar do racismo contra asiáticos estar mais escancarado desde o início da pandemia, não significa que surgiu agora com o vírus. Os Estados Unidos, por exemplo, já tiveram leis e políticas discriminatórias, como a Lei de Exclusão dos Chineses, promulgada em 1882 pela Casa Branca, vetando a imigração chinesa por mais de 60 anos.
Diferenças dos asiáticos no Brasil e Estados Unidos
A população asiática nos Estados Unidos entre 2000 e 2015 cresceu 72%, indo de 11,9 milhões para 20,4 milhões, sendo o grupo étnico que mais teve aumento. As pessoas de origem chinesa representam a maior parte, sendo 24% (4,9 milhões). Isso também aumentou o número de eleitores para votar: entre 2000 e 2020, houve um crescimento de 139%. Quase 60% dos asiáticos (11 milhões) poderiam votar nas eleições presidenciais de 2020.
Já no Brasil, a maior parte da população asiática são pessoas de origem japonesa, sendo o país com a maior comunidade japonesa fora do Japão. O censo de 2010 feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, havia registrado um aumento de 174% na população asiática. Depois foi constatado que o número estava incorreto. Cerca de 1,1% dos brasileiros se declaram como amarelo, não sendo possível contabilizar a quantidade total de asiáticos, pois no censo não tem a categoria marrom.
As redes sociais possibilitam o acesso às pautas dos movimentos das comunidades asiáticas nos Estados Unidos – e muitas delas são trazidas para a realidade brasileira. “Eu entendo que tem muitas coisas que você consegue espelhar, inspirar em algumas questões, mas também entendo que às vezes não tem uma autocrítica sobre quais são as diferenças entre ser asiático lá e no Brasil, quais são as composições da população e como essas pessoas são vistas lá”, alerta Lara Nishimura, estudante de História e membro da Labibe Yumiko, um coletivo asiático brasileiro.
O crescimento dos ataques racistas nos Estados Unidos acende um alerta aqui no Brasil. Nas redes sociais crescem discursos de ódio e práticas discriminatórias, acontecendo principalmente contra a comunidade chinesa e seus descendentes, de acordo com Karina Kikuti, psicóloga e pesquisadora de relações raciais, principalmente a racialidade amarela.
“As pessoas asiáticas podem ser afetadas diretamente, quando são alvo das microagressões inflamadas por discurso de ódio ou indiretamente, quando presenciam outra pessoa amarela sendo atacada. É necessário compreender que o contexto dos ataques estadunidense é outro, vai além de microagressões (que também são importantes e devem ser consideradas)”, diz ela.
A saúde emocional também deve ter uma atenção especial. Situações como invisibilidade e invalidação enquanto pessoa racializada não-branca, ser considerado estrangeiro mesmo nascido no Brasil e, agora, a desinformação sobre a China ser responsável pela criação e disseminação do coronavírus podem trazer vulnerabilidade emocional para as pessoas amarelas. “Ter uma rede de apoio que não invalide e apoie a expressão emocional pode colaborar. Em muitos casos, buscar psicoterapia também é importante”, recomenda Karina.
“Me sinto aliviada de não estar vendo tantas notícias sobre, porque é uma questão que dói muito, pode ser que alguém copie o que aconteceu lá, o que me dá medo. Conheço pessoas que sofreram com questões de xenofobia no Brasil e por conta do coronavírus. Eu, inclusive, fui atacada de graça no Twitter”, conta Lara, que se afastou das redes sociais para evitar ler notícias sobre os ataques.
O que pode ser feito
Karina recomenda algumas ações em relação à situação atual dos ataques, tanto para pessoas asiáticas e não asiáticas que querem ser aliados. Para quem quer ser um aliado, é importante não invalidar e incentivar denúncias, as agressões não estão acontecendo por acaso, existe um discurso fomentando crimes de ódio. Tomar ações concretas. Postar no Instagram não é suficiente, nunca foi. Então, se informar, corrigir o seu amigo que fala “sopa de morcego”, acolher seu amigo asiático-brasileiro, compartilhar conteúdo com responsabilidade, tomando cuidado para não disseminar gatilhos, divulgar canais de denúncia oficiais, fazer doações para projetos e movimentos são ações importantes.
Já para as pessoas asiáticas, a psicóloga diz que é preciso romper o pacto com a branquitude e assumir um papel ativo na luta antirracista. É preciso urgentemente deixar de fazer a manutenção de discursos racistas, porque a luta é contra o mesmo sistema da supremacia branca. O apagamento e silenciamento da dor e luta só aumenta o abismo entre outras comunidades racializadas não-brancas. Aprender sobre sua história, a história da sua família, sobre imigração, discriminação, xenofobia, branquitude. É preciso se posicionar, porque em tempos tão dolorosos, o apoio entre comunidades é essencial e, durante anos, muitas vezes, não foi feita nossa parte. Que possamos fazer agora, em escala maior, conscientes, agindo concretamente.