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Karol Conká e a cultura racista do cancelamento: “Tiveram muitos vilões”

Em entrevista para a CAPRICHO, a cantora fala sobre a cultura do (des)cancelamento e como ela nos permite fazer recortes de raça, gênero e classe

Por Isabella Otto 19 set 2021, 10h01

“Estou fazendo meu papel como todo negro, que já nasce meio que sendo cancelado e tem que passar a vida inteira provando que serve para alguma coisa”. Foi com esta frase que Karol Conká, em entrevista para a CAPRICHO, resumiu a realidade das pessoas negras no Brasil. É óbvio que elas têm vivências diferentes, e como a rapper mesmo pontuou, achar que uma pessoa negra a igual a outra só porque é negra é racismo, mas a questão da raça é muito determinante neste que foi o último país do Ocidente a abolir a escravidão. Enfrentar a cultura do (des)cancelamento e o linchamento virtual que sofreu após o BBB21 foram só mais alguns obstáculos da vida da cantora cujo racismo se fez presente.

Montagem com fotos da Karol Conká e os dizeres:
Isabella Otto/CAPRICHO

Para Karol, é nítida a diferença quando o cancelamento é com uma figura pública preta e quando é com uma figura pública branca. A rapper também disse que muitos ainda hoje acham que o tema racismo é usada como muleta por negros – no caso dela, para escapar da responsabilidade de seus atos: “O racista não aceita nada de bom. Se o artista negro não dá motivo para ser atacado, eles ficam esperando“.

A cultura do descancelamento nos permite fazer recortes sobre raça, gênero e desigualdade social. Quantas figuras já não cometerem crimes de ódio contra mulheres e racismo, e alguns meses depois estavam participando de um reality show e sendo ovacionados pelo público? O perfil é quase sempre o mesmo: um homem branco heterossexual. “Temos que apontar quais são as falhas e tentar arrumar. Porque não adianta a gente falar de empatia e acolhimento, sendo que as atitudes não são essas. A gente está sempre julgando. A gente acolhe um e julga o outro. Daí você vê que o artista branco pede desculpa e já é desculpado logo em seguida“, pontua.

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Para Conká, o descancelamento soa como um acolhimento, sendo cancelamos ideias e descancelamos pessoas – a menos que essa pessoa siga insistindo no erro, tantas vezes por orgulho, não mais por uma eventual ignorância. “É quando a gente se coloca de igual para igual. Quando você dá oportunidade para o outro, você dá oportunidade para si mesma”, opina. Quando questionada sobre como a cultura do cancelamento e o linchamento virtual caminham lado a lado, a ex-BBB posiciona-se: “Esse tipo de número [curtidas] alimenta o ego. Então, quanto mais likes, não importa se você está acabando com a vida de alguém, mais ego. Só que o número de likes e compartilhamentos nem sempre representa que aquilo é algo positivo, que acrescente mesmo. Às vezes, é um número grande de pessoas que concordam com você e estão pensando errado“.

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No último ano, Karol Conká teve que priorizar sua saúde mental, algo que nem sempre tinha o costume de fazer. Ela começou a fazer terapia, entendeu como a prática é importante e percebeu que, em muitos casos, seus canceladores entendiam estar militando e fazendo um ativismo revolucionário quando, na realidade, estavam carregados de preconceitos e sendo movidos por um racismo estrutural, que tantas vezes nem eles percebiam existir. Daí, a questão diz mais sobre eles que sobre ela: “Eu não ignoro o que fiz, mas tiveram muitos vilões no meu cancelamento. As pessoas que me atacaram foram piores do que eu em muitas situações”.

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