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“Estou cansada de suposições preconceituosas de leigos sobre o candomblé”

Leia a carta aberta da Gyo Cabral, da Galera CH, filha de Logun e Iemanjá, sobre o caso da mãe que perdeu a guarda da filha após iniciação dela no candomblé

Por Gyovanna Cabral, da Galera CH Atualizado em 30 out 2024, 23h43 - Publicado em 10 ago 2020, 13h31

Oi, eu sou a Gyovanna Cabral e geralmente falo sobre arte, poesias e prosas. Faz tempo que um assunto não me enoja tanto a ponto de querer escrever sobre ele. O texto de hoje é sobre um assunto do tipo, que não me dá raiva, mas tristeza. Sou iniciada no candomblé desde o começo do ano e fazer meu santo foi a melhor coisa que já fiz. Quem já teve a oportunidade sabe como a vida e sua percepção de mundo muda – para mim, para melhor. Sua família cresce! Se você é filho único, passa a ter vários irmãos. O candomblé com certeza me mudou para melhor.

Devo dizer que sou batizada também em outra religião, o cristianismo. Aconteceu quando eu ainda não tinha idade para consentir e opinar. Eu perdi amigas depois que entrei no candomblé. Algumas porque suas tias não aceitavam minha religião, outras porque eu me afastei na primeira piada ridícula que fizeram. Não me fazem falta, mas dói lembrar de todas as vezes que precisei guardar meu fio de conta na mochila e de todas as vezes que um desconhecido insinuou coisas horríveis sobre e para mim.

Tudo isso volta à tona sempre que leio algum relato sobre intolerância religiosa. Meu peito aperta, porque eu sei que pode acontecer de novo comigo e com pessoas que amo. Recentemente, uma menina de 12 anos decidiu se iniciar no candomblé. Para isso, é preciso ficar alguns dias reclusas no axé para nós dedicarmos aos nossos orixás. Não é um ritual abusivo, não é um ritual pesado, assustador ou anormal. A mãe da menina acompanhou todo o processo de perto, ajudou na criação dela ali dentro, mas se a história acabasse bem, eu não estaria escrevendo isso com meus olhos cheios de água. Você deve ter lido essa notícia que viralizou na última semana. Se não leu, conto o que aconteceu.

A avó da menina em questão, junto de alguns membros de sua família, resolveram mentir para as autoridades, dizendo que ela estava sendo mantida em cativeiro e sofrendo abusos. Ela teve que interromper sua feitura para resolver a situação, que não foi resolvida por conta do preconceito. No final, a mãe perdeu a guarda da filha. Tudo isso por causa da intolerância religiosa. Já foi provado que tudo estava bem, que era parte do ritual, mas ainda assim tiraram a guarda da mãe. E a única pergunta que paira na minha cabeça é: até quando? Até quando vão implicar com pessoas de fé? Até quando vamos precisar brigar por respeito? Até quando itens sagrados da minha religião continuarão a ser expostos no museu da polícia? Estou cansada de tantas suposições e opiniões preconceituosas de leigos sobre o candomblé. Como se já não fosse difícil o bastante palestrar desmentindo o sacrifício de animais (nós não matamos gatos ou cachorros ou qualquer outro animal, e se você supõe coisas do tipo comendo seu belíssimo peru no Natal, bom, além de intolerante e leigo, você é hipócrita), agora eu tenho que lidar com pessoas que punem a minha fé. A menina era de Iemanjá, assim como eu sou. Não consigo imaginar o tamanho da tristeza no coração de minha Mãe…

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Para finalizar esta carta aberta, peço de coração para que todos vocês aprendam a respeitar e estudem o mínimo para não reproduzir preconceitos. Uma forma de ajudar de longe é usar hashtags sobre racismo religioso e mandando mensagens para o conselho tutelar da cidade da menina, e seguindo páginas no Twitter como a @nossosorixas e @umbandasarava, que falam sobre resistência em religiões de matrizes africanas, que não possuem nada de demoníaco nem de assustador.

Com o pesar de estar escrevendo isso em pleno 2020,
@poesiade1minuto

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