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Amanda Ramalho deseja discussão verdadeira sobre saúde mental na internet

Criadora do podcast 'Esquizofrenoias', recebeu o diagnóstico de autismo com 36 anos e contou à CH como é seu processo de autoconhecimento e aceitação

Por Juliana Morales Atualizado em 29 out 2024, 18h28 - Publicado em 30 jul 2023, 10h00

Desde cedo, Amanda Ramalho se sentia “estranha”. Sempre muito quieta, não gostava de brincar com as crianças da sua idade. Na adolescência, a interação social se tornava um problema ainda maior. Até que, aos 15 anos, ela recebeu seu primeiro diagnóstico. Na verdade, diagnósticos, no plural. Ela gosta de explicar que funciona como se fossem duas árvores: a da ansiedade e a da depressão. Amanda tinha galhos das duas e, às vezes, eles se cruzam. Muito tempo depois, aos 36 anos, a comunicadora e criadora do podcast, Esquizofrenoias, descobriu recentemente a existência de uma terceira ramificação: a do autismo.

O diagnóstico tardio, que recebeu no ano passado, foi um choque, ela confessa. Mesmo falando muito de saúde mental no seu podcast, criado em 2018, e até já ter feito entrevistas sobre autismo, Amanda percebeu que conhecia pouco sobre o espectro. “Eu até cheguei a desconfiar, mas eu não me achava inteligente o suficiente para ser autista, já que associava isso com certa genialidade”, conta à CAPRICHO.

Como boa jornalista, Amanda foi apurar, investigar e entender aquele universo do qual fazia parte a partir daquele momento. Foi assim que nasceu, em abril, o seu novo programa: o Amanda no Espectro. Ao longo dos episódios, ela entrevista pessoas autistas que abordam sentimentos comuns, mas também as diferentes realidades. Afinal, os autistas não são todos iguais, como muitos dizem por aí, sem qualquer conhecimento.

“No começo, eu tive até uma relação de revolta. Ficava me perguntando por que ninguém tinha me falado sobre isso antes, teria sido tão mais fácil”, diz Amanda, ao relembrar de vários comportamentos que são característicos do espectro e que, agora, ela compreende como eles a impactam. É o caso da sensibilidade que ela tem quando recebe muito estímulo visual e o seu corpo contrai, como uma forma de proteção. 

O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por dificuldades de interação e comunicação. Ele existe em diferentes graus de funcionalidade e cada indivíduo lida de uma maneira. Amanda foi diagnosticada com autismo de grau 1, considerado o mais leve dos quadros.

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“Nós não precisamos caber em caixas”

O diagnóstico de Amanda, apesar de tardio, ajudou no seu autoconhecimento. “Eu comecei a entender, por exemplo, a minha hipersensibilidade a barulhos. Isso não significa que eu vá ficar trancada no quarto o dia inteiro, me protegendo, mas agora eu me ‘agrido’ menos do que antes”, diz . 

“Eu sempre precisei me tratar para me adequar e parecer com as outras pessoas.”

Amanda conta que o conhecimento e a troca com outros autistas fez ela se reconhecer melhor e se aceitar mais. “Eu nem queria ser como as outras pessoas, mas antes eu acreditava que todo mundo tinha que estar na mesma caixa, seguindo certos comportamentos”. 

Essa padronização não deve ser feita nem entre o grupo de pessoas dentro do espectro do autismo. É característico do TEA a dificuldade de comunicação (em diferentes níveis, claro), mas Amanda é uma comunicadora e apresentadora e, dentro da sua profissão, nunca teve problema com isso. Cada caso é um caso.

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“Observando muitos as pessoas, eu passei a ‘imitá-las’ na forma de se comunicar, criando uma bagagem, que me ajudou como um recurso”, conta. “Os problemas de interação social afetam muito mais minha vida pessoal do que profissional”, completa.

A discussão de saúde mental na internet

Se por um lado a internet possibilitou Amanda a ter mais contato com a comunidade autista e criar uma espaço de debate e aprendizado, por outro, a apresentadora ressalta a preocupação com generalizações e falta de conhecimento que rolam nas redes sociais tanto sobre autismo como em relação à saúde mental, que é um tema que ela fala constantemente em seu podcast.

“Tem muitos conteúdos de pessoas que dão uma roupagem de especialista nos vídeos, mas não são e só acabam construindo certa credibilidade por meio de views, likes e corações”, avalia.  Ela alerta sobre criadores de conteúdos que tentam vender soluções, fáceis ou apenas baseadas em suas próprias experiências, para problemas muito mais profundos. A procrastinação, por exemplo, que tem uma série de cursos e técnicas infalíveis que tentam vender por aí, pode ter relação com a ansiedade ou depressão e não deve ser tratada com superficialidade.

Amanda defende que saúde mental seja discutida com naturalidade e muita responsabilidade. Com isso, é possível criar um ambiente (dentro e fora do digital) de muito acolhimento e respeito. 

 

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