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“Eu sou o reflexo de tudo que a sociedade julga: negra, gorda e cacheada”

Vitória Régia é uma jornalista cearense apaixonada por moda e beleza que usa seu espaço nas redes para falar sobre autoestima e amor próprio

Por Izabel Gimenez 6 jun 2020, 10h54
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CAPRICHO/Divulgação

Recentemente, fizemos uma matéria mostrando perfis de garotas negras que fazem um trabalho incrível produzindo conteúdo sobre moda e beleza. Uma das influenciadoras citadas foi Vitória Régia, dona do perfil @VitoriaGlamoda. Durante uma entrevista para a CAPRICHO, a jornalista dividiu sua trajetória de autoestima, que apesar de ter sido dura, hoje é sinônimo de liberdade e inspiração para outras garotas. Confira abaixo o relato completo!

“Muitas vezes me senti diferente das pessoas nos espaços que eu frequentava. Não me via na televisão, nos brinquedos, nas propagandas e, de forma inconsciente, sem entender, eu sentia um certo repúdio pela minha imagem. Uma vez, quando eu era criança, passei pasta d’água no corpo e disse para minha mãe que eu queria ser branca do olho azul. Hoje eu entendo que tudo isso foi uma consequência de uma sociedade extremamente racista, mas na época era tudo inconsciente.

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Estou cada dia mais apaixonada pela nova coleção de inverno da @studiozcalcados 😍 Preciso falar desse modelo lindo que é na cor branca, com tiras trazendo uma versatilidade nas amarrações e meu xodó salto bloco, anota ai porque tudo que eu falei é tendência de moda 👀 #SejaVoceSTZ Quem quiser que eu faça vídeo de look usando ela comenta aqui 🙋🏽‍♀❤

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Eu sempre gostei de maquiagem, moda e de ser ‘aparecida’, mas por conta do meu corpo, da minha cor e do meu cabelo, eu não conseguia me ver fazendo isso. Por isso, fui me rendendo para conseguir me encaixar nos padrões pré-estabelecidos: alisamento, dietas milagrosas e até remédios. A verdade é que nada disso iria funcionar porque todas essas questões estavam na minha cabeça e eram um reflexo da minha insegurança em relação à como as pessoas me enxergavam. Até eu entender tudo isso, foi um processo que durou 10 anos.

Quando chegou minha adolescência, eu ganhei uma bolsa de estudos para um colégio mais elitizado da minha cidade, e lá me dei ainda mais conta do quanto eu era diferente. Sofri bullying por quatro anos e ouvia de muita gente que eu não ia ser ninguém na vida. Meu cabelo era motivo de piada. Ele já foi chamado de ‘bombril’, questionavam até como eu lavava. Depois de muitos anos, não aguentei. Não queria mais ir à escola, comecei a ir mal, minhas notas abaixaram e eu perdi a bolsa. Foi quando minha mãe descobriu toda a situação.

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ta parecendo até natal, eu de vermelho e toda arrumada pra ficar em casa 😂❤️

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Tudo que eu passei nesse colégio foi um gatilho para que eu começasse a me esforçar para conseguir me encaixar e passar despercebida. Então resolvi alisar os fios. Até hoje eu tenho muito trauma de ambientes escolares, não sou de fazer muitos amigos porque sempre me bate um medo de ser julgada pela minha aparência. Foi só na faculdade que as coisas realmente começaram a mudar.

Na sala de aula, tínhamos várias discussões sobre política, empoderamento e eu comecei a pesquisar sobre esses temas. Achei a Nataly [Neri], do Afros e Afins, e foi vendo vídeos como os feitos por ela que eu realmente me entendi como mulher negra. Até então, eu vivia um dilema sendo ‘branca demais’ para ser negra e ‘negra demais’ para ser branca. Fui conhecendo mais sobre racismo, colorismo, desigualdade social, e isso me fez começar minha transição capilar, que foi um dos passos mais importantes para minha autoaceitação.

No começo, foi difícil. As pessoas diziam que eu iria ficar feia e que eu até podia ter o cabelo cacheado, mas que não podia ser black. Eu fui tentando trabalhar essa autoconfiança em mim. O que me ajudou foi acompanhar meninas negras nas redes sociais, isso fez com que eu me sentisse mais corajosa. Me entender como negra, e que coisas que já passei na vida eram racismo, fez com que eu conseguisse assumir quem eu era.

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Minha reação vendo uma ruma de live no meu perfil todas as noites 😂

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Depois disso, precisei passar pelo processo de aceitar meu corpo e entender que eu era gorda. Precisei parar de tentar caber em roupas menores. Na época, eu não aceitava que vestia tamanho 50 e ficava na neura de caber em uma peça 38. Hoje, eu cuido de uma compulsão alimentar desencadeada por essas dietas restritivas e da depressão que me acompanhou por muitos anos. Sem dúvidas, trabalhar com redes sociais me ajudou muito.

No início, eu só postava fotos do meu rosto e das minhas maquiagens. Não me sentia segura de mostrar meu corpo. Tudo mudou depois que eu participei do reality show produzido pelo canal Diva Depressão com o Youtube Brasil. No primeiro episódio, eu recebi um feedback de várias garotas que sempre quiseram ver uma mulher como eu no mundo da beleza, e percebi que várias meninas olhavam para o meu conteúdo e sentiam que também poderiam fazer tudo isso, porque eu sou o reflexo de tudo que a sociedade julgou por anos: negra, gorda e cacheada”. 

Relato inspirador, né? <3

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