Rosa Weber vota pela descriminalização do aborto até 12 semanas

Ministra avalia que Código Penal é inconstitucional em voto histórico; julgamento foi interrompido e não tem nova data

Por Andréa Martinelli Atualizado em 29 out 2024, 18h18 - Publicado em 22 set 2023, 10h51

Nós já te contamos por aqui que, nas últimas semanas, o direito ao aborto legal no Brasil voltou à pauta do STF (Supremo Tribunal Federal, lembra? Acontece que, na madrugada desta sexta-feira (22), a presidente da corte, ministra Rosa Weber, votou a favor da descriminalização da interrupção voluntária da gravidez até as 12 primeiras semanas de gestação.

O posicionamento é considerado histórico e abre um novo momento para discutir a questão aqui no Brasil, viu? A ação avaliada pela ministra – chamada ADPF 442 – começou a ser julgada virtualmente no Supremo ontem, mas um pedido de destaque apresentado pelo ministro Luís Roberto Barroso jogou a análise para o plenário físico, em data ainda não definida.

 

Barroso, inclusive, é o próximo a presidir a tribunal e, em outros momentos, já se posicionou a favor da ação – caberá a ele, a partir de agora, pautar o processo no plenário físico com todos os ritos tradicionais da corte.

A ação, da qual Rosa é relatora, foi pautada no sistema eletrônico do tribunal para que ela pudesse apresentar seu voto antes de se aposentar. No próximo mês ela completa 75 anos, limite de idade para aposentadoria dos ministros do STF.

Em seu voto, Rosa argumentou que restringir o acesso ao aborto no Brasil não considera “a igual proteção dos direitos fundamentais das mulheres [e meninas]” e que “não se mostra como política estatal adequada para dirimir os problemas que envolvem o aborto, como apontam as estatísticas”

Ministra pontua ainda que criminalizar não é uma política estatal adequada para a questão. “A justiça social reprodutiva, fundada nos pilares de políticas públicas de saúde preventivas na gravidez indesejada, revela-se como desenho institucional mais eficaz na proteção do feto e da vida da mulher, comparativamente à criminalização”.

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Mas qual é a realidade do Brasil, CAPRICHO?

aborto brasil
Cris Faga/NurPhoto/Getty Images

Segundo dados da PNA (Pesquisa Nacional Sobre Aborto), realizada em 2021, uma a cada duas mulheres fez um aborto antes dos 19 anos. Dessas, 6% antes dos 14 anos. A violência é cometida na maioria das vezes, segundo o estudo, em um espaço que deveria ser de cuidados e proteções: os violentadores são tios, avós, pais e padrastos e acontece dentro de casa.

Talvez você não saiba mas, aqui no Brasil, a interrupção voluntária de gravidez é proibida em todas as situações, a não ser em casos em que não há outro meio de salvar a vida da pessoa grávida, quando a gestação é resultado de estupro ou quando o feto tem anencefalia (ausência total ou parcial do cérebro) — este último caso foi garantido por uma decisão do próprio STF em 2012. Pessoas que abortam estão sujeitas à pena de um a três anos de detenção.

O pedido do partido junto ao STF deseja que esta punição seja excluída do nosso Código Penal. Apresentada em 2017, a ação afirma que tratar a questão como crime é violar princípios fundamentais presentes na Constituição desde a dignidade da pessoa humana até a garantia de liberdade, igualdade ou até a proibição à tortura.

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O Código Penal atual diz que:

Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico: 
Aborto necessário
I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
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Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Pelas regras do tribunal, o primeiro voto é da ministra Rosa Weber, que é relatora da ação e já foi contabilizado. Ah, ele não é invalidado com a aposentadoria dela, ok?

E, sim, o tribunal é cheio de regrinhas e procedimentos. Com o retorno do julgamento ao plenário físico, os procedimentos-padrão da corte são retomados, como as sustentações orais das partes – contra e a favor do tema apresentado – e as devidas manifestações da Procuradoria-Geral da República (PGR) e Advocacia-Geral da União (AGU).

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Neste caso, além de tudo, existem outros 10 ministros para apresentar o voto e é de conhecimento público que o aborto legal não é o assunto fácil de se tratar por lá ou no próprio Congresso Nacional, já que em ambos existem grupos que representam interesses contrários e com foco em argumentos religiosos.

Ah, e já é de conhecimento público que a AGU – órgão que representa o governo na corte – defende que o tema não deveria ser tratado no Supremo, mas sim no Congresso, sob pena de “grave dano ao Estado brasileiro e aos seus cidadãos, que têm debatido amplamente a questão por meio de seus representantes no Parlamento”.

Em nota pública, as advogadas que apresentaram a ação em 2017, afirmam que a garantia do “aborto legal e seguro é uma necessidade de saúde e por isso deve ser cuidado com políticas de saúde e não controlado por políticas criminais” e que “O aborto não pode ser tema para punir ou castigar, mas sim para cuidar, proteger e reduzir danos.”

Dados do Fórum de Segurança Pública (FBSP) – que produz relatórios com base em dados públicos – mostram que ao menos uma mulher é estuprada a cada 10 minutos por aqui; e cerca de 19 mil meninas de 10 a 14 anos se tornam mães todos os anos, muitas após serem vítimas de violência sexual. 

A OMS (Organização Mundial da Saúde) também já reconhece e recomenda que mulheres e meninas devem ter direito ao aborto seguro e planejamento reprodutivo como parte dos cuidados em saúde.

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