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O discurso de Bolsonaro que não cita Lula, mas “indignação” de apoiadores

Presidente falou por dois minutos nesta terça após dois dias em silêncio; sem citar o resultado, ele falou em "indignação" e justificou bloqueios

Por Andréa Martinelli Atualizado em 30 out 2024, 15h24 - Publicado em 1 nov 2022, 17h40
bolsonaro
Bolsonaro chega sorridente acompanhado de outros ministros de seu governo para pronunciamento nesta terça-feira (1) Getty Images/Getty Images

O presidente Jair Bolsonaro (PL), na tarde desta terça-feira (1), falou pela primeira vez após ser derrotado nas urnas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno das eleições 2022 no último domingo (30).

“Eu quero começar agradecendo os 58 milhões brasileiros que votaram em mim”, disse. Em um discurso breve, por cerca de 2 minutos, ele rejeitou o rótulo de antidemocrático e disse que “sempre andei nas quatro linhas da constituição e nunca falei em controlar a imprensa ou as redes sociais” e que “superou” a pandemia e a guerra na Ucrânia.

Em nenhum momento ele falou no nome de Lula ou citou sua vitória nas urnas. O momento em que percebemos que ele reconhece o resultado das eleições é quando, próximo do microfone, ele cochicha com o atual ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, e diz “vão sentir saudade da gente, né?”, antes de começar o discurso.

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Esta fala após o término do pleito eleitoral é tradicional – ainda mais quando há um atual mandato em curso. Em várias eleições pelo mundo, não só no Brasil, reconhecer a derrota e cumprimentar o adversário é uma prática de diplomacia (ou seja, elegante, democrática e respeitosa). Mas desde o último domingo (30), Bolsonaro ficou em silêncio.

E você deve ter visto a notícia do dia: quebra de silêncio do presidente também aconteceu em meio a bloqueios nas principais rodovias do país por grupos radicais bolsonaristas que pedem “intervenção federal” após o resultado das eleições. Estas manifestações acontecem desde a noite de ontem, segunda-feira.

Bolsonaro disse que estes “movimentos populares são fruto de indignação e injustiça de como se deu o processo eleitoral. As manifestações pacíficas serão sempre bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os mesmos da esquerda que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição do patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir”, disse, ao justificar os bloqueios que podem causar sérios transtornos ao abastecimento de cidades e estados.

E vale explicar para a nossa galera: esta não é uma manifestação de categorias como de caminhoneiros e representantes dos transportes e, sim, de pequenos grupos de apoiadores do presidente Bolsonaro.

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“A direita surgiu de verdade no nosso país. Nossa robusta no congresso mostra a força dos nossos valores. Formamos diversas lideranças pelo Brasil. Nossos sonhos estão mais vivos do que nunca”, afirmou, ao ressaltar que enfrentou “todo o sistema” e exaltou a representação “robusta” da direita no Congresso após as eleições de 2022.

Pro Bolsonaro Truck Drivers Block Roads After Election Defeat
Apoiadores do presidente Bolsonaro bloqueiam a Dutra, uma das principais rodovias do país, para protestar contra o resultado das urnas Wagner Meier/CAPRICHO

Ainda ontem, Alexandre de Moraes, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) determinou que a PRF (Polícia Rodoviária Federal) e polícias militares tomem medidas para liberar rodovias. Há quem associe também o silêncio do presidente Bolsonaro com um incentivo e aceno positivo à estas manifestações governistas – esta teria sido também uma pressão para que, finamente, ele falasse à nação.

Analistas políticos avaliam que Bolsonaro ficou isolado após ficar em silêncio e, com as manifestações de grupos que fecharam rodovias, mesmo após uma votação expressiva da população em sua candidatura, ele teria perdido o apoio de outros setores da sociedade como o agronegócio e a indústria, que se posicionaram contrários à estes bloqueios.

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Isso é um problema grande porque estas manifestações não só são consideradas antidemocráticas e ameaçam o direito de ir e vir dos cidadãos, como podem comprometer entrega e distribuição de gasolina, carnes e serviços de saúde para todo o país, que tem seu abastecimento concentrado nas principais rodovias federais.

O silêncio do presidente durou dois dias

Bolsonaro Remains Silent After Being Defeated by Lula in Presidential Runoff
Bolsonaro é fotografado andando no Palácio do Alvorada nos dias após o encerramento da corrida eleitoral Andressa Anholete/Getty Images

Após o resultado das eleições de domingo, Bolsonaro ficou isolado e inacessível para a maior parte dos aliados e atendeu apenas alguns interlocutores por telefone. Segundo o Estadão, ministros próximos se reuniram com o presidente no Palácio do Planalto e avaliaram o discurso que foi lido por Bolsonaro nesta tarde. Por volta das 15h, a Secretaria Especial de Comunicação Social informou que o presidente faria pronunciamento em instantes no Palácio da Alvorada.

Durante o período em que ficou em silêncio, segundo VEJA, apenas três ministros do governo e o vice-presidente Hamilton Mourão reconheceram a derrota e apoiaram a transição de governo com o novo presidente eleito. Além disso, os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Fábio Faria (Comunicações) e Marcelo Queiroga (Saúde) já fizeram declarações e enviaram sinais que, na prática, reconhecem o resultado da eleição.

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Mas porque isso é importante – e grave assim?

Entre a corrida eleitoral e a polarização de direita e esquerda, dúvidas estão sendo jogadas sobre a veracidade do sistema eleitoral brasileiro. “Processos eleitorais são fundamentais para que democracias se mantenham”, explica Flávia Biroli, professora de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) em conversa com a CAPRICHO.

Talvez você não saiba disso, mas o nosso sistema é referência para o mundo todo. Quando o assunto são eleições, estamos muito avançados em relação a algumas das maiores potências mundiais, como os Estados Unidos, que ainda fazem eleições majoritariamente com cédulas de papel.

Esse sistema super bem montado e, principalmente, seguro, foi amplamente questionado por Bolsonaro. O chefe do executivo escalonou ataques ao sistema eletrônico de votação, questionando sua eficácia junto às Forças Armadas e, entre outras falas, já chegou a ameaçar que seu partido irá contratar uma empresa para fazer uma auditoria privada das eleições deste ano.

Em contrapartida, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) reforçou que os testes do sistema, que inclui simulações de ataques hackers, não encontraram falhas que possam atrapalhar o pleito eleitoral. Isso porque, como a gente já te explicou aqui no CH na Eleição, o voto é a arma mais poderosa que um cidadão tem em uma democracia.

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A partir do momento em que ele é questionado, questiona-se também toda a estrutura democrática, o que abre brechas para regimes autoritários – como a própria ditadura que o Brasil viveu de 1964 a 1985, por exemplo. Bolsonaro tem mantido desde a campanha de 2018 um discurso em que, sem nenhuma prova, coloca dúvidas sobre o sistema eleitoral brasileiro.

Em várias ocasiões ele deu a entender que não aceitará outro resultado que não seja a sua vitória nas urnas, o que gera um desequilíbrio de forças políticas que nunca vimos por aqui desde a redemocratização.

Assista ao programa CH na Eleição sobre a urna eletrônica:

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