CCJ da Câmara aprova proibir aborto em todos os casos, incluindo estupro
Segundo a proposta, todos os casos passariam ser também a ser um crime; pesquisas e fertilização in vitro seriam inviabilizadas. Entenda
CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara aprovou a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que proíbe o aborto no Brasil até em casos previstos na lei, como estupro. Ou seja, segundo a proposta, todos os casos, inclusive os que são permitidos atualmente, passariam ser também a ser um crime.
Parece complexo de entender, leitor e leitora de CAPRICHO? Bem, se você está com alguma dúvida ou quer entender melhor a questão, vamos juntos nesse texto entender exatamente o que rolou hoje, quarta-feira (27) lá na Câmara dos Deputados e como isso pode impactar a vida de milhares de jovens, meninas e mulheres pelo país.
Deputada do PSOL-SP, Sâmia Bomfim, durante a sessão, a classificou a PEC como um “retrocesso” para todas as mulheres. “A proposta impede o direito ao aborto, inclusive quando isso significa risco de morte para a gestante, e aqui, eu quero deixar bem claro: essas mulheres escolheram ser mães”, afirmou a deputada.
A parlamentar continua, afirmando que esta “é uma opção política de se impor às mulheres brasileiras uma vida de dor e sofrimento para aquelas que não querem ser mães porque não são obrigadas a carregar a gestação de um estuprador”, e completa, afirmando que a PEC fere também “aquelas que querem ser mães, mas não conseguem pelo método tradicional e não vão poder pelo método de fertilização in vitro.”
É importante saber: a interrupção da gravidez é considerada um crime no Brasil, desde 1940. Porém, o procedimento é permitido em alguns casos: quando a mulher corre risco de morte e gravidez ocasionada por estupro; além disso, o STF (Supremo Tribunal Federal) autorizou o procedimento em gestações de fetos com anencefalia (ausência de cérebro ou de parte dele).
A PEC – a proposta que altera a Constituição – foi aprovada após horas de discussão e muita confusão, que suspendeu a sessão por alguns minutos. Alguns deputados da ala mais conservadora e considerada pró-vida, como a relatora da PEC, a deputada Chris Tonietto (PL-RJ), chegaram a levar bonecos em formato de fetos para defender seus argumentos.
Mesmo com muita tensão e embates entre defensores dos direitos das mulheres e bancada religiosa e conservadora, o texto foi aprovado por 35 votos favoráveis e 15 contrários.
Mas, calma. Isso não significa que imediatamente toda e qualquer forma de interrupção da gravidez se torna um crime. A proposta ainda passará por outro colegiado especial, ou seja, a partir de agora, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), precisa autorizar a instalação de uma comissão especial para analisar o projeto.
Com a comissão instalada, a discussão ainda vai longe: segundo as regras, o grupo terá 40 sessões para debates. Porém, Lira tem a prerrogativa de pautar a proposta para votação no plenário da Câmara a qualquer momento – e, a partir de agora, segundo apuração da CAPRICHO, deputados e deputadas da esquerda e membros do movimento feminista irmão articular.
Depois da comissão especial, a PEC precisa ser aprovada no plenário da Câmara em dois turnos. Em cada um, são necessários três quintos dos votos (308). Em seguida, seguirá para o Senado.
Mas, da onde surgiu essa ideia de proibir de vez o aborto, CAPRICHO?
Bem, essa proposta não é nova. Ela foi apresentada lá em 2012 pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (Republicanos-RJ).
O texto da PEC muda o artigo 5° da Constituição Federal para garantir a inviolabilidade do chamado direito à vida, “desde a concepção”.
Ou seja, isso significa que, se o Congresso aprovar a PEC, mesmo os casos em que o aborto é permitido por lei, serão proibidos. Isso porque a Constituição é soberana às leis.
Caso a PEC seja levada adiante, o cenário será o seguinte:
- Vítimas de violência sexual seriam forçadas a manter a gravidez, inclusive crianças;
- Gestações de risco deveram ser levadas até o fim e poderiam resultar na morte da pessoa gestante;
- Técnicas de fertilização in vitro seriam inviabilizadas;
- Pesquisas com células-tronco para cura de doenças graves poderiam ser proibidas.
A deputada Dani Cunha (União-RJ), que é filha do ex-deputado, esteve na sessão e defendeu o texto do pai. Segundo ela, “o aborto é, nada mais, nada menos, que o assassinato de um bebê indefeso. Quem defende o aborto é cúmplice desse assassinato. Não se trata de religião, se trata exclusivamente de respeito à vida previsto da Convenção Interamericana.”
Segundo dados da PNA (Pesquisa Nacional Sobre Aborto), realizada em 2021, uma a cada duas mulheres fez um aborto antes dos 19 anos. Dessas, 6% antes dos 14 anos. A violência é cometida na maioria das vezes, segundo o estudo, em um espaço que deveria ser de cuidados e proteções: os violentadores são tios, avós, pais e padrastos e acontece dentro de casa.