6 pontos para prestar atenção no relatório de especialistas para o G20
São necessárias metas mais ambiciosas para restringir o aquecimento a 1,5 graus. E ainda não é suficiente.
m 2025 se completam dez anos do Acordo de Paris e o balanço é preocupante. Vivemos um momento crítico para o futuro do planeta, cuja face mais visível é a inegável intensificação de eventos extremos.
Aumenta a pressão por medidas concretas que precisarão ir além de compromissos vagos e promessas de longo prazo. Com a COP30 se aproximando – que será realizada no Brasil, inclusive – e a agenda climática global ganhando força, é essencial refletir sobre os avanços e os obstáculos que ainda enfrentamos.
Por isso é tão importante a publicação do relatório independente de um Grupo de Especialistas convidado pela Task Force do Clima do G20. Elaborado por um time de pesquisadores mundialmente reconhecidos, o estudo oferece uma análise precisa sobre desafios centrais que definirão o futuro da ação climática.
O documento destaca que os esforços precisam ser intensificados e melhor coordenados, uma vez que o problema não é apenas técnico ou ambiental; é também político, social e econômico. Como um dos coordenadores da Secretaria Executiva deste Grupo de Especialistas, destaco, dentre os vários tópicos abordados, seis temas sensíveis, e que merecem atenção. São eles:
1. Metas mais ambiciosas e o papel do G20
Os relatórios da Nações Unidas têm apontado que os compromissos já estabelecidos serão insuficientes para reduzir as emissões de forma a alcançar o objetivo de restringir o aquecimento a 1,5°C. Países em geral, e especialmente os do G20 (responsáveis por 80% das emissões globais e também por 80% do PIB mundial), precisam adotar metas muito mais ambiciosas para conter a crise climática. Embora o G20 não assine acordos mandatórios, como a Convenção do Clima, seu peso político e econômico é imenso nas negociações climáticas globais. Sem o compromisso firme desses países, dificilmente conseguiremos frear o avanço do aquecimento global.
2. Meios de implementação: além das promessas
Não basta anunciar aonde queremos chegar. Mesmo as metas já estabelecidas precisam de melhores meios de implementação. É preciso colocar em prática instrumentos concretos de política pública e articulação entre os setores público e privado que garantam o alcance dos objetivos climáticos pactuados. Uma peça central aqui são as “políticas industriais verdes”, que precisam ser entendidas em um sentido amplo, englobando políticas produtivas que transformem a forma como produzimos e consumimos em todos os setores.
O Acordo de Paris é um tratado internacional sobre as mudanças climáticas adotado em 2015 durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP21), realizada em Paris.
Seu principal objetivo é limitar o aumento da temperatura global a bem abaixo de 2°C acima dos níveis pré-industriais, com esforços para restringir esse aumento a 1,5°C.
Para alcançar isso, o acordo estabelece metas de redução de emissões de gases de efeito estufa.
3. Coordenação interna: alinhamento de políticas e setores
Inovações setoriais são importantes, mas terão um efeito limitado se isso for visto como apenas mais um componente de uma agenda governamental. O relatório alerta para o risco de tratarmos as políticas industriais verdes como um programa ou política isolada, enquanto o restante da ação estatal continuar promovendo modelos tradicionais de produção e consumo. Precisamos de uma abordagem integrada, para que as ambições climáticas orientem de maneira coesa e transversal a atuação do Estado e das políticas públicas em todas as áreas. Sem isso pode haver um “jogo de soma zero” para a agenda climática, com os efeitos de alguns investimentos e incentivos em atividades convencionais anulando os resultados positivos obtidos com políticas alinhadas com ambições climáticas mais ousadas.
4. Coordenação global: governança e comércio internacional
Sem um esforço coordenado entre as nações, a adoção de incentivos e investimentos em políticas de transição a uma economia de baixo carbono podem criar novas desigualdades. Incentivos adotados por países ricos, por exemplo, podem atrair capitais que poderiam estar indo para países mais pobres e que restariam excluídos dessa nova economia. O relatório sublinha a importância de uma governança global que favoreça uma transição justa entre os países. Reformar as regras do comércio internacional para incorporar critérios ambientais, garantindo que essas novas regras não se tornem barreiras econômicas para países em desenvolvimento, ou para que haja estratégias de adaptação entre os mais pobres para esse novo regramento, que já começa a existir, são peças fundamentais desse quebra-cabeças.
Metas de redução de emissões: Cada país que assinou o acordo (mais de 190 nações) é responsável por estabelecer suas próprias metas de redução de emissões, conhecidas como Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). Essas metas são revistas a cada cinco anos e devem ser progressivamente mais ambiciosas.
Neutralidade de carbono: O objetivo é atingir um equilíbrio entre a emissão e a remoção de gases de efeito estufa na atmosfera na segunda metade deste século, ou seja, alcançar a neutralidade de carbono (ou “zero líquido”).
Financiamento climático: Países desenvolvidos concordaram em fornecer apoio financeiro para ajudar os países em desenvolvimento a enfrentar os desafios das mudanças climáticas. O compromisso é mobilizar 100 bilhões de dólares por ano até 2020, com a meta de continuar esse financiamento até 2025.
Monitoramento e transparência: O acordo estabelece um sistema de transparência para garantir que os países cumpram seus compromissos e compartilhem informações sobre seus progressos.
5. Desigualdades e justiça na transição climática
Enfrentar a crise climática não pode agravar as desigualdades existentes, tanto entre países quanto dentro deles. O relatório defende que a transição para uma economia verde deve incluir as populações mais vulneráveis, garantindo que elas participem dos processos de tomada de decisão e se beneficiem de novas oportunidades econômicas. Essa inclusão é essencial, especialmente em um momento em que muitas das tecnologias emergentes têm caráter poupador de trabalho ou dependem de recursos naturais disponíveis em áreas onde vivem populações vulneráveis. Isso pode aumentar a exclusão social.
6. Finanças climáticas: o papel do setor público e privado
Em relação ao financiamento da agenda climática, o relatório ressalta a importância de combinar recursos públicos — essenciais para acelerar mudanças cujo retorno econômico pode demorar a chegar e seriam, por isso, menos atrativas ao investimento empresarial — com a mobilização de recursos privados – que são cada vez mais volumosos e precisam ser bem direcionados. Não há dicotomia entre esses dois caminhos. Outros temas são igualmente importantes em finanças climáticas. É o caso dos bancos internacionais e de desenvolvimento, como o Banco Mundial e o BNDES, que podem ter um papel ainda mais destacado; ou dos Bancos Centrais, que precisam definir em seus mandatos formas de regular e incentivar a agenda climática nos sistemas financeiros. Outra questão abordada é a dívida dos países mais pobres, que precisa ser tratada de forma a garantir que eles tenham espaço fiscal para investir na modernização de suas economias sem serem excluídos do processo global de transformação verde.
O relatório deixa claro que estamos em uma encruzilhada. Se continuarmos com a abordagem fragmentada que tem caracterizado grande parte da ação climática global, corremos o risco de aprofundar desigualdades e falhar na construção de um futuro sustentável. O momento agora é de decisão: ou aceleramos juntos nessa jornada, ou estaremos aprofundando um ciclo de retrocessos e desigualdades que afetará dolorosamente gerações futuras.