Ao inaugurar fase nova com sua a marca, agora independente, Bianca Andrade diz que não vai se conformar com padrões e atesta coragem de ser desobediente.
por Sofia Duarte
Atualizado em 13 dez 2024, 13h13 - Publicado em
13 dez 2024
12h00
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azer a diferença. Esse é o propósito de Bianca Andrade na vida de outras meninas e mulheres. Seja com o projeto social Boca Rosa Academy, que atua nas periferias visando auxiliar empreendedoras a fortalecerem suas vozes e ampliarem seus negócios, ou com a marca de maquiagem Boca Rosa, que quer trazer praticidade à rotina atarefada das brasileiras.
A influenciadora pioneira no nicho de beleza nas redes sociais, que começou a criar conteúdo no YouTube aos 16 anos em seu quarto no Parque União, favela do Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, aposta no poder de inspirar. “Nós, mulheres, temos cada vez mais essa sede de ser independente, de querer ser dona da nossa vida, das nossas escolhas, e isso é um caminho muito desafiador. Então, a gente tem que se apoiar”, afirma Bianca.
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Em conversa com a CAPRICHO, a empresária mostra que não tem medo de se reinventar a cada fase. E ela já passou por muitas, viu? Desde seu movimento audacioso de participar do Big Brother Brasil 20 – que resultou em um crescimento expressivo do seu negócio – até a coragem em se arriscar ao desenvolver sua marca de maquiagem de forma independente.
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Essa fase, aliás, chegou quebrando padrões logo de cara com uma cartela de 50 tons de base, a mais diversa do Brasil. No entanto, ela também foi alvo de críticas em seu pré-lançamento, em junho de 2024, devido a falhas encontradas em 3% dos produtos vendidos, número o suficiente para a decisão de ouvir os consumidores e realizar correções.
São nesses momentos cruciais que Bianca define sua postura como questionadora e desobediente. “A curto prazo pode ser que não faça sentido, mas a longo prazo eu sei o que eu estou construindo, e não é a primeira vez que eu faço isso. É aí que a gente se coloca como desobediente.”
Capa da CAPRICHO em uma edição impressa após 10 anos como 100% digital, a influenciadora, mãe do Cris, de 3 anos, e empresária multifacetada olha com carinho para sua trajetória e celebra suas conquistas, sem tirar os pés do chão, consciente e de olho em um futuro independente.
Leia a entrevista completa:
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CAPRICHO: Voltando para a Bianca adolescente que morava na favela da Maré: quais eram os sonhos dela?
Bianca Andrade: É muito legal lembrar da minha adolescência. Eu era mais sonhadora do que hoje, porque não tinha noção ainda das consequências [risos]. Mas eu tive a coragem de sonhar e, naquela época, eu sonhava em ser uma profissional reconhecida pelo meu trabalho, que era gravar conteúdo e maquiar. Eu tinha até uma árvore dos sonhos em que estava escrito: ‘Quero ser uma maquiadora reconhecida nacionalmente’. Aprendi com a minha mãe que o sucesso vem com a força do trabalho. Se a gente trabalha, se compromete com o que a gente faz, de uma forma ou de outra, a gente vai ter sucesso e, às vezes, não é a fama, não é um número estrondoso de pessoas te vendo, mas é a satisfação de ter um trabalho fazendo a diferença, seja para um milhão de pessoas, seja para quem está ali à sua volta.
Como era a sua autoestima na adolescência?
Era melhor que hoje, porque eu me comparava menos. Eu me achava o máximo [risos]. Porque não tinha rede social na época, né? Por isso, a gente tem que tomar cuidado com a comparação; ela pode acabar com a nossa autoestima, e a gente nem se dá conta. É importante passar isso para os jovens. Estar o tempo inteiro nas redes sociais faz você comparar os seus valores com os dos outros e, aí, você acha que o seu está sempre ruim. E também eu tinha uma rede de apoio, tinha minha mãe que sempre falava que eu era maravilhosa. Era muito importante. Por isso que eu gosto de ser esse apoio também.
A Bianca adolescente daria algum conselho para você hoje?
Sem dúvidas! “Gata, desliga esse celular e vai se olhar no espelho! Olha quem você é, olha o que você já construiu, olha a pessoa incrível que você é”. É aquela frase: “você se elogia o tanto que você se critica?” A autoestima é algo de dentro para fora. Tem hora que eu mesma dou esse sacode em mim.
Você pensa no que vai ou não expor nas redes sociais?
Com certeza. Na verdade, até o que eu passo para frente é justamente essa mensagem que a gente deve escolher o que postar. Tudo o que a gente posta é uma responsabilidade e influencia as pessoas. Então, temos que ter consciência daquilo que a gente fala e defende. E para nós mesmos também, porque a gente não precisa expor a nossa vida o tempo todo para ter bons resultados nas redes sociais. Têm coisas que eu escolho não postar e isso é de fato intencional. Eu penso: ‘O que eu consigo contribuir?’. Porque eu não tô na rede social para falar só de mim. Eu tô na rede social para promover debates, questionamentos, para gente evoluir junto como sociedade.
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Isso é importante também para a sua saúde mental?
Para a saúde mental de todo mundo. Sempre quando eu posto alguma coisa, eu reflito: ‘Eu tô pensando muito no lugar da minha bolha ou tô pensando no contexto?’. Porque a gente se compara nas redes sociais, e essa é uma das maiores responsáveis pela ansiedade e depressão da juventude, a comparação do seu bastidor com o palco dos outros. A gente posta o que a gente quer, e o que a gente vive no bastidor nem sempre é o que a gente quer. Então, para a nossa saúde mental, é muito importante a gente saber disso, porque a internet não é a realidade.
Quais são os hábitos importantes que você tem para manter sua saúde mental e ser feliz no dia a dia?
Os primeiros minutos do meu dia são os mais importantes. Eu aprendi isso depois dos 30 anos, e eu gostaria que a geração dos adolescentes não esperassem os 30 anos para aprender. O que o jovem faz hoje? Acorda e já pega o celular. É a pior coisa que a gente pode fazer para a nossa saúde mental. Depois que aprendi isso, virou lei: eu acordo e paro, respiro, agradeço pelo meu dia, por acordar, por dormir em uma cama quentinha, agradeço pela minha vida, pela vida do meu filho e peço para o universo, para Deus abençoar mais um dia. A gente perdeu isso, e é o mínimo.
O que é o projeto Boca Rosa Academy e como ele inspira outras mulheres periféricas?
Esse projeto veio para devolver um pouco do que a minha rede de apoio que tive na época [da adolescência] me ajudou. Porque, se não fossem as minhas amigas, as minhas vizinhas, a galera da favela da Maré, eu não teria crescido, eu não teria tido as primeiras pessoas que me acompanharam. Esse projeto de fomentar o empreendedorismo feminino nas favelas me lembra o quanto uma mulher periférica é potente, o quanto a gente é potente. A questão é que elas já são empreendedoras, elas só precisam se reconhecer e ter ferramentas que auxiliem para que elas consigam crescer.
Eu gostaria que a geração dos adolescentes não esperassem os 30 anos para aprender. O que o jovem faz hoje? Acorda e já pega o celular. É a pior coisa que a gente pode fazer para a nossa saúde mental.
Bianca Andrade
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Esses dias você também chamou seguidoras para irem à sua casa, né?
Sim. De alguma forma, eu quero mostrar que elas de fato são importantes para mim, não é da boca pra fora. Eu gosto de mostrar por meio de ações, o diferencial está em você colocar carinho no detalhe. Tanto que a gente fez uma identidade visual das Boca Rosers, porque, sem elas, eu não estava aí hoje. Tem pessoas que pensam que depois que você chega em um nível de sucesso, não precisa mais se importar. É o contrário; quanto mais sucesso você faz, mais você precisa ser consciente e valorizar o outro.
Você tem noção do impacto que você causa nas pessoas?
Ter noção do todo é difícil, mas eu me mantenho grata por cada passo que eu dou e pelas pessoas me apoiando. Nós, mulheres, temos cada vez mais sede de ser independente, de querer ser dona da nossa vida, das nossas escolhas, e isso é um caminho muito desafiador. Então, a gente tem que se apoiar.
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O conceito chave da CAPRICHO agora é ‘Manifeste, Desobedeça, Seja Você’. O que significa ser desobediente para você?
É você se questionar e trazer consciência. Quando a gente fala sobre ser desobediente é porque a gente está falando de uma sociedade que quer impor as coisas para as pessoas, principalmente de cima para baixo. E é aí que a gente tem que ter a consciência do nosso coletivo. As empresas querem lucrar e nem sempre a razão da consumidora é colocada na mesa. É nisso que Boca Rosa é desobediente. A curto prazo pode ser que não faça sentido, mas a longo prazo eu sei o que eu estou construindo e não é a primeira vez que eu faço isso. É aí que a gente se coloca como desobediente.
Quando a gente fala sobre ser desobediente é porque a gente está falando de uma sociedade que quer impor as coisas para as pessoas, principalmente de cima para baixo. E é aí que a gente tem que ter a consciência do nosso coletivo.
Bianca Andrade
Você ainda enfrenta o machismo como empreendedora mesmo já tendo certa autoridade no mercado?
Com certeza, porque é estruturado, né? Por isso que tive que apostar tanto em resultado. Por isso que minha saúde mental quase foi para o lixo, de tanto que eu me responsabilizava em entregar um resultado excelente para provar para os caras que eles iam ganhar dinheiro com esse meu trabalho com Boca Rosa – isso quando eu fazia uma cocriação. É um trabalho diário.
O que significa para você ser capa da CAPRICHO?
CAPRICHO é minha adolescência inteira. Faz parte da minha vida e muito do que aprendi, inclusive, de ter acesso à informação, foi com a CAPRICHO. Muito do que eu tinha ali de insumo para sonhar, da parte gostosa de ter inspiração, motivação, tem muito da CAPRICHO também, sabe? Obrigada, CAPRICHO, por fazer uma revista física, porque, em 2015, quando a revista se torna 100% digital, a gente não fazia ideia ainda do malefício que poderia trazer a gente ficar 100% digital, né? Quando a gente tem uma revista na mão, acabamos não rolando o feed, né? A leitura física libera essa dopamina lenta que faz bem para a nossa saúde mental.
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O que você planeja para 2025?
O meu foco total é a minha marca. Quero trazer cada vez mais excelência na qualidade dos produtos. Eu quero cada vez mais investir em inclusão e diversidade, me incomodar com essa falta de inclusão no mercado em todas as categorias de produtos. A gente lançou uma cartela de 50 cores [de base]. Imagina que eu poderia ter voltado com gloss [risos]. Seria muito mais barato e não teria todo o desafio que tive, mas eu também não teria a motivação que eu tenho hoje. O que me move é o propósito; se não, seria mais uma marca de maquiagem. Em 2025, não esperem nada de mirabolante. Esperem produtos de qualidade, inclusivos e conscientes cada vez mais, e uma marca que dá orgulho para a consumidora.
E quais são os seus sonhos?
Acho que sentir menos culpa é o maior sonho na minha vida, para eu poder aproveitar melhor tudo aquilo que sonhei e que estou realizando. Mas, a sensação é sempre de ‘preciso continuar’. E eu preciso entender que eu tenho um privilégio muito grande na minha mão. Então, agora é hora de trazer isso para a minha consciência. A gente dá check nos sonhos, realiza, mas e aí? A vida continua. Ainda mais eu que venho da favela, a gente não tem essa calma do tipo: ‘Ai, se alguma coisa der errado agora, tudo bem, eu faço parte de uma família bem sucedida, que pode arcar…’ Eu não tenho ninguém. Tenho a minha família que está comigo nessa, no nosso primeiro negócio. E lucro não é a coisa mais importante da minha vida, a marca se sustentar é a coisa mais importante da minha vida.
E haja terapia, né?
Sim, e às vezes três vezes por semana. E a minha fala é muito privilegiada, porque quando eu tô lá com as meninas do Boca Rosa Academy, o sonho delas é, sim, ser grande, porque assim elas veem uma esperança de serem reconhecidas pelo que elas se esforçam tanto. E minha vida nunca foi só sobre faturamento, até porque se fosse eu não estaria aqui. Porque eu comecei sem recurso, eu comecei tendo uma rede de apoio. Meu sonho é ter certeza do meu lugar, fazer mais terapia, ter autoconhecimento e me influenciar menos pelo meio elitizado e corporativo, porque o meu lugar não é esse e nunca foi. E ter mais consciência da história que eu estou construindo. Com isso eu vou ter mais paz e saúde mental. É entender que eu já realizei tudo o que eu queria realizar e, agora, eu preciso só fazer a diferença.