Como as contas de acervo estão movimentando a cultura pop online
Criadores narram bastidores das contas que crescem cada vez mais entre fãs de artistas e personagens

ocê já tentou encontrar uma tirinha específica da Turma da Mônica no X/antigo Twitter e, como mágica, ela apareceu na sua timeline? Ou riu de um meme de Sabrina Carpenter e outras divas pop? Pois é, isso provavelmente foi obra de uma conta acervo — não um museu com paredes e molduras, mas um perfil online que cataloga, resgata e contextualiza o caos (e a cultura pop) com muita dedicação.
Essas contas são o cérebro externo da internet: reúnem imagens, falas, momentos e trechos específicos, tudo organizado em algum canto misterioso — ou, muitas vezes, nem tão organizado assim. Conversamos com dois criadores por trás de perfis que fazem esse trabalho de curadoria apaixonada: o acervo sabrina carpenter (@sabrinacervo) e a nat jurídico turma da mônica (@its_nyat).
Amor de infância (ou de adolescência) que virou projeto online
No caso de Natália Montenegro, 30, do Rio de Janeiro, a paixão pelos gibis começou cedo. “Os primeiros gibis que eu lembro de ler são de 98, 99. Eu ainda nem sabia ler direito, mas já tinha Sansão, jogo de tabuleiro, gesso pra moldar a Mônica…”, compartilhou. A familiaridade virou afeto, que virou acervo: hoje ela mantém um perfil que funciona quase como um oráculo para fãs da Turma da Mônica, atendendo pedidos dos seguidores e resgatando tirinhas que nem a própria MSP lembrava mais que existiam.
Já Micael do Nascimento, 22, de Itapecerica da Serra (SP), descobriu a paixão por Sabrina Carpenter ao som de Smoke and Fire, ainda em 2017. “Desde então, acho que todas as contas que eu tive foram pra ela. É uma conexão realmente muito forte”, destacou. O @sabrinacervo nasceu em 2021, misturando o amor de fã com senso de humor. E viralizou.
O processo criativo: entre organizações caóticos e ideias que surgem do nada
A pergunta mais comum para qualquer acervo é: como você lembra dessas coisas? “Na maioria das vezes é de memória. Eu lembro do nome da revistinha e jogo no Google, Facebook, YouTube… até achar”, explicou Natália. Mas não se engane: o caos reina nos bastidores. “Tem mais de mil prints no meu celular, tudo desorganizado. Está tudo espalhado em pastas com nomes tipo ‘fofuras’ ou ‘reação’. Um dia eu me organizo… Talvez.”
Micael também não tem um sistema rígido. “As ideias vêm do nada. Aí eu vou atrás da mídia, edito e posto. Não é nada complexo demais”, ele confessa. Spoiler: funciona. Um de seus tweets mais icônicos, envolvendo um ventilador e um show cancelado da Sabrina no Rio, rendeu risadas e muita visibilidade pro acervo — até fora da bolha do fandom.
a nossa diva indo dormir assim hoje https://t.co/G2XvG8Idc7 pic.twitter.com/2n8xi62WUs
— acervo sabrina carpenter (@sabrinacervo) November 18, 2023
O impacto (mesmo quando eles juram que é pequeno)
Natália se considera humilde. “Não acho que minha conta tenha impacto a nível de comunidade. Mas já recebi várias mensagens de gente dizendo que voltou a ler gibis, a ir em sebos. Isso é muito legal.” Micael já sente o efeito mais diretamente: “Muita gente diz que eu fui um dos responsáveis por aumentar a repercussão da Sabrina no Brasil. Já gritaram comigo na rua porque me reconheceram do acervo”, contou, entre risos.
Ambos reforçam o carinho da comunidade. “É impossível responder todo mundo, ainda mais com o Twitter bugando. Mas sempre que posso, ajudo a achar tirinhas específicas”, ressaltou Natália. Micael sente que o laço entre os fãs brasileiros e Sabrina é quase de família. “A conexão é muito verdadeira.”
tá vendo a falta que faz turma da mônica na formação do cidadão? https://t.co/ek5gfSzN0r pic.twitter.com/nvGSo6UUzE
— nat jurídico turma da mônica (@its_nyat) February 15, 2025
Quando o ídolo reconhece o acervo
Um dos momentos mais marcantes da vida online de Natália foi quando a própria conta oficial da Turma da Mônica passou a seguir eu perfil. “Foi um alívio! Pensei: ‘Graças a Deus não vão me processar!’”, brincou. “Me senti reconhecida, mas também mais tranquila. Eu tenho muito respeito pelo universo da Mônica, então, sempre tento manter a conta limpa, sem piadas de duplo sentido ou coisas que a MSP não gostaria de ver.”
VELHO PELO AMOR DE DEUS ISSO JÁ É MALUQUICE COMO A NAT JURIDICO DA TURMA DA MONICA TEM UM QUADRINHO DA TURMA DA MONICA PRA CADA SITUAÇÃO EXISTENTE ISSO FOI MTO ESPECÍFICO KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK https://t.co/8qYZ9ztCJG
— _ᴶrͦeͣsͦende 🐔⭐⭐⭐ (@jrdasilvakkkkkk) March 19, 2025
Já no caso do @sabrinacervo, o reconhecimento não é institucional, mas é direto dos fãs — e isso basta. “Pra mim é tudo. Eu amo fazer isso. E saber que as pessoas riem, se conectam, lembram de momentos por causa do que eu posto… é surreal.”
tô morrendo com isso aqui mds viu que era outra sabrina carpenter e começaram a dançar pic.twitter.com/g71cNQzeDe
— acervo sabrina carpenter (@sabrinacervo) April 8, 2025
O futuro do acervo é coletivo
Apesar de não se considerarem figuras de grande influência, tanto Micael quanto Natália têm consciência de que seus perfis ajudam a manter vivas algumas conexões afetivas com o conteúdo que amam. “Eu não sei como as crianças de hoje consomem Turma da Mônica, mas vejo que muitos jovens adultos estão redescobrindo os gibis. E acho lindo fazer parte disso”, pontuou Natália.
No fim, talvez seja isso que torne os acervos tão especiais: são feitos com amor, memória e uma boa dose de dedicação despretensiosa. Eles são o lembrete de que cultura pop, quando bem guardada, vira patrimônio emocional — e isso não tem algoritmo que explique.