Projeto de lei que tramita no Senado propõe “Bolsa Estupro”
O texto original do senador Eduardo Girão também propõe que o estuprador tenha direito à paternidade
Um projeto de lei proposto pelo senador Eduardo Girão (Podemos-CE) em dezembro do ano passado, que cria o Estatuto da Gestante, e está em tramitação no Senado, vem causando indignação de movimentos que defendem os direitos das mulheres. O texto do PL 5435/2020 prevê “o direito à vida desde a concepção”, uma forma de dificultar o acesso ao aborto legal no país. Além disso, o projeto de lei propõe um auxílio para mulheres grávidas em razão de violência sexual, ideia que já foi sugerida em outras propostas e ficou conhecida como “bolsa estupro”. Segundo a proposta inicial, o Estado deve pagar à mulher um salário mínimo até que o filho complete 18 anos ou o estuprador pague a pensão alimentícia. O estuprador ainda teria direito à paternidade e a mãe seria proibida de “negar ou omitir tal informação ao genitor”.
Acreditava-se que o texto seria votado esta semana, mas, segundo a senadora Simone Tibet (MDB-MS), que foi designada como relatora do projeto, com a crise causada pela pandemia do coronavírus ainda não há uma data estabelecida. Tibet, que entrou em acordo com Girão e aceitou reestruturar o projeto, está ajudando a elaborar um novo texto e disse que nele não estará presente o artigo 11º, que previa o auxílio financeiro à vítima de estupro. Segundo a senadora, a restrição ao aborto legal também será excluída.
A proposta gerou repercussão nas redes sociais e a hashtag #BolsaEstupro ficou nos trendings topics do Twitter durante a segunda-feira (22/3) e a tarde desta terça-feira (23).
O senador Eduardo Girão (PODEMOS/CE) está propondo o Projeto de Lei 5435/2020 em que retrocede os direitos da mulheres proibindo o aborto em caso de estupro. Pior, ele propõe que o estuprador tenha direitos como PAI da criança
+#bolsaestupro #GravidezForcadaETortura— maria (@mariatoniar) March 22, 2021
Gente, vamos espalhar a tag #GravidezForçadaÉTortura É grave: o PL5434 quer ressuscitar o #BolsaEstupro. Se uma mulher/menina estuprada engravidar, o Estado ou o estuprador vai pagar uma pensão p/ela e p/criança. Ñ haverá + direito de interromper a gravidez em caso de estupro!— Lola Aronovich (@lolaescreva) March 22, 2021
Bolsa estupro?? O Brasil é uma piada🥳 #BolsaEstrupo pic.twitter.com/0kllBZsmII
— 𝕭𝖗𝖚 (@brubsdt) March 23, 2021
querem obrigar as mulheres a continuarem a gravidez resultante do ESTUPRO e chamarem o estuprador de PAI, querem nos OBRIGAR A CHAMAR O NOSSO ESTUPRADOR DE PAI dos nossos filhos
estuprador NÃO É PAI
ser mulher no brasil virou tortura #BolsaEstupro #AbortoLegal pic.twitter.com/lLMdY6bfJx— carol🌱 (@kerolllllllll) March 23, 2021
Ninguém paga a dor de engravidar do violador! Digo Não a #BolsaEstupro! #GravidezForçadaÉTortura pic.twitter.com/9BjySoxu4w
— SOS Corpo Instituto Feminista para a Democracia (@lutafeminista) March 22, 2021
Não é a primeira vez que o “bolsa estupro” é discutido. Damares Alves anunciou através de um discurso em 2018 que pretendia retomar o Estatuto do Nascituro, um projeto paralisado em 2013 e que previa proteção máxima aos bebês desde que eles fossem fetos. A retomada deste Estatuto tinha como objetivo interromper a ADPF 442, uma proposta de descriminalização do aborto no Brasil, e assim a “bolsa” seria um auxílio para que as mulheres não abortassem e o estado arcaria “com os custos respectivos até que venha a ser identificado e responsabilizado por pensão o genitor ou venha a ser adotada a criança, se assim for da vontade da mãe”, segundo discurso da ministra dos Direitos Humanos.
No Brasil, as vítimas de violência sexual têm direito ao aborto legal, entretanto, segue sendo um desafio realizá-lo. Um exemplo foi o caso de uma menina de 10 anos do Espírito Santo, que foi abusada pelo tio e precisou interromper a gravidez em agosto do ano passado. Mesmo com autorização da Justiça, médicos do primeiro hospital em que a criança foi se negaram a realizar o procedimento. A vítima precisou, além de enfrentar o trauma que sofreu, viajar para outro estado e viver um clima marcado por medo, com o hospital cercado por um grupo antiaborto.