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Os perigosos clichês de comédias românticas que A Barraca do Beijo repete

Seis momentos em que o filme foi um tanto quanto problemático e nem um pouco empoderador. Será que você também se inquietou com eles?

Por Isabella Otto Atualizado em 31 out 2024, 10h25 - Publicado em 4 ago 2018, 13h26

Nos últimos meses, a coisa que mais escutei, de diferentes pessoas e em diferentes situações, foi: “Você tem que ver A Barraca do Beijo“. Confesso que demorei um pouco para ser fisgada pelo filme, mesmo sabendo que ele tinha sido (e continua sendo) um sucesso. Tinha medo de não gostar e me sentir um extraterrestre, até porque a maioria das pessoas que conheço amou a produção original da Netflix. Mas também tinha medo de gostar, mesmo tendo sido alertada sobre os perigosos clichês machistas bastante presentes no longa. Certo dia, mais precisamente no último domingo, 29, acordei me sentindo “neutra” e decidi ver qual era a dessa barraca.

Reprodução/Reprodução

Quando o filme terminou, não sabia bem o que estava sentindo. Não me apaixonei pela história tão intensamente quanto já me apaixonei por outras comédias românticas, mas também não tinha achado ruim. Conversando com alguns amigos, percebi algo que só então me fez refletir mais a fundo sobre A Barraca do Beijo: os trechos machistas não me incomodaram tanto porque eu já estou tristemente habituada a eles. Nós já estamos, na verdade. O original Netflix não traz nada de novo. Na realidade, ele é mais do mesmo. Isso não é um ponto negativo e é totalmente explicado pelo fato de a autora do livro que deu origem ao filme ser adolescente quando escreveu a história e, possivelmente, uma grande fã de comédias românticas dos anos 90 e 2000, como Ela É Demais10 Coisas Que Eu Odeio em Você.

Apesar de a atual discussão sobre feminismo estar causando impactos positivos no cinema e em suas protagonistas, é inegável que a ultrapassada fórmula das comédias românticas continua fazendo sucesso – e o fenômeno d’A Barraca do Beijo é um exemplo claro disso. Não é errado gostar do lançamento. Eu gostei, apesar de não ter achado nada muito especial. E eu gosto de tanto filme cheio de problemáticas que não tenho moral nenhuma para dizer do que se pode gostar ou não. (risos nervosos) Mas é importante admitir que o gênero Chick Lit, em especial, é carregado de problematizações e reconhecê-las é essencial (e isso não te impede em nenhum momento de gostar dos filmes/livros). Pode achar fofinho, divertido, pode chorar, rir, pode até criar FC! Só não pode fechar os olhos para os seguintes pontos:

1. O estereótipo da nerd que não sabe se maquiar
No começo deste texto, eu citei o filme Ela É Demais, de 1999. A protagonista Laney Boggs é parecida com Elle Evans em alguns sentidos muito específicos: as duas são as inteligentes da turma e representam o contrário do que é ser popular na escola. Como que por consequência, elas não entendem nada de moda e maquiagem. É um padrão seguido por Chick Lits. Acontece também em De Repente 30, por exemplo, com a Jenna de 13 anos, que se maquia de forma exagerada para a sua festa. Me incomoda esse estereótipo criado em cima de padrões sociais que rotulam que ou você é inteligente ou você é bonita, ou você estuda ou cuida da aparência. É tudo muito caricato e, na minha opinião, já ultrapassado. Sabe aquela história de que você pode ser feminista e continuar de batom vermelho? É isso.

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2. O garoto popular que se apaixona pela mocinha e é transformado por ela
É claro que o amor é transformador. Eu também não tenho um coração de gelo (alô, Elsa!) no peito. Mas é um tanto quanto problemático dar a entender quase sempre que a garota tem esse poder de mudar o cara com quem está saindo, mesmo que ele dê todos os sinais de que claramente não quer nem vai ser mudado. O primeiro ponto é que, se você quer mudar muitas coisas em uma pessoa, bem, talvez seja melhor rever a relação, né? Segundo, esse lance de o garoto falar “vou mudar por você” pode causar uma pressão danada na menina que está assistindo ao filme e uma baita frustração. E se na vida real ele não mudar? Quer dizer que ela não fez as coisas direito? Que ele não a ama tanto? Um relacionamento tem que somar e é fato que ambas as partes têm que ceder e se adaptar a novas realidades. Mas esse discurso de que “a diferença é você”, frase que Noah Flynn fala no filme, é complicado pra caramba!

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3. O bad boy que é visivelmente agressivo (mas, no fundo, tem um bom coração)
Quando personagens do tipo me são apresentados, eu sempre penso na Fera: ela tinha uma personalidade questionável mesmo antes de virar um monstro e, na realidade, a animação da Disney brinca justamente com o fato de ela ter se transformado em alguém melhor justamente quando todos a julgavam negativamente pela “capa”. A Fera realmente tinha um bom coração, apesar das muitas atitudes agressivas. Mas o que me causa desconforto é esse clichezão de comédias românticas que praticamente obriga todos os bad boys a serem agressivos. É como se isso fosse característica essencial e a gente sabe que, apesar das muitas e diferentes definições de “garoto mau”, esse estereótipo de que homem tem que ser machão, bom de briga, mulherengo, só contribui para a cultura machista contra a qual lutamos diariamente.

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4. O melhor amigo superprotetor
Apesar de ser total #TeamLee (estou falando de aparência mesmo. Quando ficou decidido que o irmão galã é o Noah? Hahaha), as cenas em que o Lee usa aquelas regrinhas de amizade estabelecidas por ele e pela Ellen para deixar claro que não aprova que sua melhor amiga fique com seu irmão foram umas das que mais me incomodaram. É como se (1) ficasse estabelecido que essa preocupação é sinal de amizade e (2) sutilmente sugerisse que o irmão nerd não quer perder para o irmão popular. Mas o pior de tudo é que essa superproteção, na maioria das vezes, tira o poder de decisão da mão de Ellen e a transforma em uma garota indefesa, como se ela não soubesse o que é melhor para ela nem tivesse a liberdade de fazer a escolha errada e quebrar a cara depois. Isso é importante! A escolha é dela. Amigos ficam felizes pela sucesso do outro, não? É a regra nº18.

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5. A primeira vez impossível
Livros e filmes servem exatamente para isso: nos tirar da realidade, fazer a gente esquecer os problemas e, muitas vezes, sonhar com coisas que nem sempre vão acontecer – ou podem acontecer na vida real. É incrível sonhar com a possibilidade de ter a primeira vez na Califórnia, aos pés do letreiro de Hollywood. Aff! Que maravilhoso, né? Nada dá errado, é tudo perfeito, “perigoso é divertido”. Ok, mas é importante lembrar que idealizar demais pode causar frustração. Além disso, o filme não precisa ser todo fantasioso para ser incrível. A beleza também pode ser encontrada na primeira vez sincerona, com direito à torta de climão. O filme A Primeira Vez, de 2012, deixa isso bastante claro. Simplesmente Acontece, de 2014, também.

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6. Uma protagonista empoderada, pero no mucho
Uma cena em especial que me fez sentir um pouquinho de vergonha alheia é quando Ellen, que entra por engano no vestiário masculino do colégio, sai dançando só de sutiã e com a camiseta na mão no meio dos meninos. Você pode pensar: “Ah, mas isso mostra que ela é empoderada, não se deixa intimidar, faz suas próprias escolhas”. O “x” da questão, entretanto, é que ela só faz isso para confrontar Noah, que ordenou que ela saísse do banheiro. Claramente não foi um lance de confrontar a voz masculina de comando, mas de irritar o crush. Até que ponto essa atitude pode ser considerada empoderadora?

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Sinceramente, eu gostaria de saber o que vocês acharam de A Barraca do Beijo. Por que gostaram muito ou então por que não amaram tanto? E, mais uma vez, podem me convidar para ver essa e outras comédias românticas, viu? É um guilty pleasure que vou continuar tendo – mas que vou continuar problematizando em alguns momentos. Uma coisa não anula a outra, afinal de contas. Mas tem que “brincar” de encontrar o erro de vez em quando, né?

Ah! Levo o brigadeiro. 😉 

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