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O sucesso da novela ‘Vai na Fé’ e o que ele diz sobre a nossa sociedade

Novela de Rosane Svartman aborda temáticas raciais importantes e tem sido amplamente elogiada nas redes sociais.

Por BLOG DA GALERA 4 Maio 2023, 15h05
topo thais avilez
Barbara Marcantonio/CAPRICHO

“Vai na Fé” alcançou 26 pontos de audiência. Para olhos leigos, é um número aleatório. Já para o mundo do audiovisual, um sinônimo de sucesso. É justamente esta fama que fez com que a novela de Rosane Svartman, em apenas 3 meses de exibição, se tornasse uma das grandes apostas contemporâneas da Rede Globo.

Com um enredo que mescla drama, romance, empoderamento e ativismo, a trama das 19h protagonizada por Sheron Menezzes é a mais nova queridinha do público, fazendo com que diversos jovens optem pela TV aberta ao invés da navegação pelas plataformas de streaming.  Mas qual será o motivo para tamanha repercussão?

Para entender esse “estouro”, primeiro precisamos compreender o que consagra uma novela como bem-sucedida. Quando pensamos em produções que marcaram épocas, lembramos de cenas icônicas e personagens que nos envolveram com suas histórias, sejam elas tristes, felizes ou perversas – até porque todo mundo gosta de um bom vilão, né? Nos recordemos de Avenida Brasil, por exemplo. Você pode até não assistir nada que passa no horário nobre da TV, mas com certeza já ouviu falar na Carminha alguma vez na vida.

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O enredo e os personagens de uma novela tendem a acompanhar a atualidade. Esse é o motivo para a criação de várias edições de Malhação ao longo dos anos, e também a razão para seu fim. A narrativa foi sendo adaptada conforme as transformações da sociedade e consequentemente do público, até o momento em que se percebeu que aquilo já não fazia mais sentido para o telespectador. No fim das contas, mesmo com as invenções, exageros e clichês dos roteiros (Quem não curte um teste de DNA polêmico, né?), gostamos de ver histórias com as quais nos identificamos. 

Por isso que Vai na Fé caiu no gosto popular, mesmo não sendo no horário principal da Globo e tendo menos tempo de tela do que outros programas que passam no canal. É a história de uma família negra, periférica, que batalha todos os dias para conseguir botar comida na mesa e que investe nas filhas para que, no futuro, elas não precisem mais passar pelos apertos que vivem hoje. Agora me diz: quantas vezes você não escutou ou viu algo parecido na vida real? Como, num país em que 54% da população é negra, não seria extremamente fácil para o público se conectar com essa narrativa?

Também é sobre como essa história é contada. Pela primeira vez, a vida dos brancos e dos ricos está em segundo plano, dando voz para grupos tradicionalmente não representados no audiovisual. Talvez nunca tenhamos acompanhado antes a história de uma dançarina de baile funk, como é o caso de Sol, com o olhar de denúncia que a novela traz ao mostrar que a protagonista foi estuprada nesse ambiente. Não só isso, mas que essa violência foi causada por um dos tantos playboys da zona sul que sobem os morros justamente para cometer esse tipo de crime contra mulheres negras. 

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Algumas cenas também merecem destaque: A Kate (Clara Moneke) tendo o cabelo trançado, e a novela dedicando um pedaço do episódio apenas para mostrar esse processo; Hugo (MC Cabelinho), a princípio apenas um bandido de Piedade, mas que depois se revela um excelente grafiteiro e artista; Dona Marlene (Elisa Lucinda), abandonando a peruca lisa – que usava por ter alopecia – e abraçando os cachos; Yuri (Jean Paulo Campos) sendo reconhecido injustamente por crimes duas vezes, indo preso e quase perdendo sua bolsa na universidade. Todas essas experiências englobam a vivência, as dores e a cultura cotidiana preta, mas jamais tinham sido exploradas com tanta ênfase na televisão como agora. 

 

Se Vai na Fé é um sucesso, é porque pessoas negras cada vez mais sentem a necessidade de serem representadas positivamente na cultura nacional. E que a sociedade, ainda que precise melhorar muito quando o tema é racismo, já entende a importância de ceder espaços com alta visibilidade, como 40 minutos de exibição na maior emissora da América Latina, para combater o preconceito. Seja você #TimeBen – que convenhamos, é o melhor – ou #TimeLui, uma coisa é clara: ainda temos muitas emoções para vivenciar nos próximos capítulos da novela, que com certeza foi um dos grandes acertos do “plim plim” nos últimos tempos.

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