Continua após publicidade

O que é estupro virtual e como você pode denunciar o crime

O que podemos aprender com a trama de Karina (Danielle Olímpia), em Travessia, vítima de estupro virtual, stalking e sextorsão

Por Isabella Otto Atualizado em 29 out 2024, 18h48 - Publicado em 8 abr 2023, 10h01

A novela Travessia, da TV Globo, ganhou uma nova discussão importante e que vem tirando o sono de muita gente com cenas de embrulhar o estômago.

A personagem Karina (Danielle Olímpia) achou que estava conversando na internet com a atriz e influenciadora Bruna Schuller (Giullia Buscacio), mas estava, na realidade, conversando com um homem branco e idoso (Claudio Antonio Ferreira Tovar), que usou um programa de inteligência artificial para se fazer passar pela artista.

Há poucos capítulos, o criminoso se revelou e começou a chantagear a adolescente, dizendo que ia enviar as fotos que tinha dela para amigos, familiares e professores, caso ela não tirasse o vestido que estava usando e ficasse pelada para ele. Desde então, a vida de Karina mudou, e a jovem dá sinais de depressão e automutilação.

O que é estupro virtual?

A delegada Helô (Giovanna Antonelli) fez um alerta e explicou em rede nacional o que configura o crime de estupro virtual. “Outro caso de estupro virtual! Impressionante como o crime é rápido em se adaptar às tecnologias novas! Uma influencer agora! O vagabundo explanou, mandou as fotos da menina pro colégio inteiro, pra lista de contato, detonou a garota”, disse a personagem.

O estupro virtual é uma variação do crime de estupro, previsto no artigo 2013 do Código Penal. É o ato de “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. A pena varia de 6 a 10 anos de prisão.

Ela é agravada quando a vítima é adolescente e tem entre 14 e 18 anos (8 a 12 anos de prisão) ou quando é menor de idade, uma vez que há a prática de estupro de vulnerável (8 a 15 anos).

Estupro virtual e sextorsão são a mesma coisa?

Não. Embora, em alguns casos, as palavras sejam usadas como sinônimos, há diferenças.

Continua após a publicidade

Sextorsão é um crime virtual no qual o agressor chantageia e ameaça a vítima normalmente em troca de dinheiro – mas pode ser por vingança ou humilhação.

Geralmente, o criminoso tem acesso a conteúdos íntimos da pessoa, que são usados como moeda de troca. “Se você não fizer o que eu estou mandando, vou enviar isso para todo mundo”.

O criminoso de Travessia fez exatamente isso com Karina, mas teve o agravante dele usar a sextorsão para praticar ato libidinoso. Ou seja, obrigar a adolescente a ficar pelada a fim de satisfazer-se sexualmente. Isso é o que configura o crime de estupro virtual: há sempre a prática de ações cuja finalidade é satisfazer o desejo sexual do autor do crime.

Continua após a publicidade

A relação com o crime de stalking

O estupro virtual caminha lado a lado com outro crime previsto no artigo 147-A no Código Penal: o de stalking.

É o ato de “perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade”.

A pena também é agravada quando o crime é cometido contra menores de idade e quando somado a outros, como o de estupro.

Karina, de Travessia, chorando na cama. Ela é uma menina negra de cabelos longos e cacheados
Karina após ser vítima de estupro virtual TV Globo/Travessia/Reprodução

Como denunciar um estupro virtual?

Medo e vergonha são os principais motivos que levam as vítimas a se calarem. Em casos de menores de idade, esse cenário é dificultado, uma vez que o jovem não quer que os pais saibam do ocorrido.

Continua após a publicidade

Denunciar, contudo, é muito importante para a segurança pessoal da vítima e de outras presas. E há algumas formas de fazer isso:

  • registrando um boletim de ocorrência em uma Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher;
  • registrando um BO em delegacias comuns ou naquelas especializadas em crimes cibernéticos, como é o caso da delegacia da Dona Helô, de Travessia;
  • acionando a Polícia Militar (190), o Disque Direitos (100), a Central de Atendimento à Mulher (180) ou fazendo uma denúncia online, no aplicativo do Governo Federal ou pelo portal do Ministério das Mulheres.

Quanto mais provas a vítima tiver, melhor. Por isso, tire print de conversas, ameaças, mensagens, salve documentos, grave conversas e registre o máximo de coisas possível. E, é claro, muito cuidado ao conversar com estranhos na internet, especialmente se eles começarem a fazer pedidos suspeitos, como para compartilhar dados pessoais, tirar a roupa, etc.

Por fim, se você for vítima de um golpe do tipo, não se culpe. A culpa nunca é da vítima! A culpa é sempre do criminoso.

Homem usando intelifência artificial para se passar por outra pessoa
O criminoso de Travessia usando IA para cometer estypro virtual TV Globo/Travessia/Reprodução
Continua após a publicidade

O primeiro caso de condenação por estupro virtual

A primeira condenação por estupro virtual aconteceu em 2018, três anos após o crime ser cometido.

Um garoto de 10 anos, morador de São Paulo, foi abordado no site Omegle por um homem que usava o nome falso de Pedro Dalsch e dizia ter 27 anos.

A conversa acabou se estendendo para fora da plataforma e tomando um rumo bastante parecido com a trama de Karina, na novela Travessia.

O crime foi descoberto pelo pai da criança, que acionou a polícia. O autor do crime era um pediatra e sexólogo do Rio Grande do Sul. “Havia muitos arquivos de crianças e adolescentes com nomes brasileiros e com características latino americanas. Foi um sinal de que não era apenas um consumidor de pornografia infantil, mas que estávamos diante de um predador sexual”, explicou Júlio Almeida à BBC, advogado que na época estava a frente do processo.

O caso foi julgado e o criminoso foi condenado a 12 anos e 9 meses de reclusão. Foi o primeiro episódio de condenação por estupro virtual no Brasil. “Foi inédito e acabou gerando a possibilidade de outros casos acabarem com a mesma condenação”, revelou Almeida.

Publicidade