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O papel da escola no cuidado da saúde mental e prevenção do suicídio

Em entrevista à CAPRICHO, a psicóloga Karen Scavacini aponta os diferentes aspectos do debate da saúde mental no ambiente escolar

Por Juliana Morales 29 set 2024, 17h00
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ovem, você se sente acolhido na escola? Você conversa com amigos e professores sobre questões emocionais? Ou o ambiente escolar perpetua com o silenciamento de suas dores? Esses questionamentos se fazem necessários, uma vez que a escola não é fundamental apenas na formação do conhecimento, mas também no bem-estar de crianças e adolescentes, como vocês, leitores da CAPRICHO.

Essa é uma bandeira defendida por Karen Scavacini, doutora em Psicologia e Fundadora do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio. Ela rebate quem diz que “escola não é clínica”, como uma forma de eximir a instituição e seus profissionais da responsabilidade.

“Escola não é clínica de psicologia, mas é o local onde os jovens estão e ela precisa cuidar do bem-estar mental deles”, enfatiza durante entrevista à CH na última semana de setembro, mês em que acontece a campanha brasileira de prevenção ao suicídio.

A saúde mental do jovem em 2024

Quando falamos de saúde mental dos adolescentes, o cenário é preocupante. Os índices de depressão entre a nossa galera só aumenta. Pela primeira vez na história, os registros de ansiedade entre crianças e jovens superam os de adultos, segundo análise da Folha a partir da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) do SUS de 2013 a 2023, período com dados disponíveis.

E a taxa de suicídio entre jovens brasileiros cresceu 6%, entre 2011 e 2022, como mostrou o estudo do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para a Saúde (Cidacs), da Fiocruz Bahia.

A realidade refletida nesses dados se dá de uma maneira multifatorial, segundo Karen, que alega que não dá para reduzir questões tão complexas e colocar a culpa apenas nas redes sociais. Sim, a tecnologia e hiperconectividade têm grande parcela no problema, mas há muitos outros aspectos a serem discutidos, como as mudanças climáticas e o  contexto pós-pandemia em que estamos inseridos, exemplifica a especialista.

“Por mais que pareça que já faz um tempão que aconteceu a pandemia, os jovens estão lidando com uma dificuldade de enfrentar frustrações e de socializar em decorrência aos dois anos atípicos e que seriam muito importantes para o desenvolvimento deles”, analisa Karen, ao lembrar o quanto a nossa galera isolada de frente às telas.

Pesquisas mostram isso em números, como o relatório “Jovens e Ensino Médio”, publicado pela UNICEF e a Rede de Conhecimento Social em 2023, que apontou que 9 a cada 10 estudantes do ensino médio relatam ter sentido alguma condição de saúde por conta da pandemia. As principais são ansiedade, uso exagerado de redes sociais e exaustão. O estado emocional e a qualidade do sono são vistos como regulares ou péssimas por quase 6 a cada 10 deles.

É preciso olhar para todas as faces do problema

Diante desse cenário de sociabilização deteriorada que o papel da escola se faz ainda mais necessário no cuidado da saúde mental do jovens. Primeiro, porque as questões emocionais influenciam o aprendizado e podem acarretar também na evasão escolar. Mas há ainda outro problema que tem relação direta com os problemas psicológicos e que não pode sair de pauta: a violência escolar. 

No primeiro semestre do ano passado, observamos uma triste onda de ataques violentos em instituições de ensino brasileiras. Os casos que tiraram a vida de alunos e professores vão muito além da problemática da falta de segurança, como apontou o relatório da Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE), publicado em dezembro de 2022. Segundo o estudo, os casos de ataques nas escolas praticados por alunos e exalunos, em geral, são normalmente associados ao bullying e situações prolongadas de exposição a processos violentos, incluindo negligências familiares, autoritarismo parental e conteúdo disseminado em redes sociais e aplicativos de mensagem.

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De lá para cá, houve avanços, sim, como a lei que reforça proteção a crianças e adolescentes contra violência nas escolas, mas é preciso ir além. “Como a maioria das leis, ela precisa ser implementada. Temos o exemplo da Lei de Prevenção do Suicídio que está praticamente no papel”, aponta Karen. Mas a especialista diz que não trata-se de colocar toda a responsabilidade na escola apenas ou sobrecarregar os professores ainda mais. A instituição precisa de um amparo legal para colocar em prática.

Ela dá o exemplo de casos em que uma instituição identifica um aluno com sofrimento mental e que necessita de tratamento, mas a demanda do CAPES já está alta demais e a escola fica desamparada nesse sentido. Ou aqueles casos que, para implementar projetos de saúde mental, é preciso sobrecarregar professores, que nem receberam a capacitação correta para isso.

“As leis precisam ser implementadas para dar suporte a essas escolas e profissionais para que eles consigam implementar dentro da sua realidade e dentro das adaptações culturais que são necessárias em cada região do Brasil”, defenda Karen.

Mas, então, como a escola pode colaborar com a saúde mental dos alunos?

Karen, que é CEO do Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio, conta que as próprias escolas trazem relatos de jovens extremamente ansiosos, com dificuldade de concentração e de realizar as tarefas, aumento dos casos de depressão  e de autolesão. “É óbvio que lá no final da ponta dessas situações vai estar o suicídio, como uma denúncia de que tem muita coisa que está errada em termos de sociedade e como ela lida com questões psicológicas, psiquiátricas e questões culturais”, diz a especialista.

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Para ajudar a evitar que chegue a esse extremo, a escola pode atuar no meio desse caminho, desde a prevenção até pequenos ajustes práticos na vida do estudante.

“O papel da escola é identificar jovens em sofrimento, falar com os responsáveis e encaminhá-los para o tratamento adequado. Se possível, ter o acesso ao psicólogo escolar que pode fazer uma avaliação e também trazer esse tema para dentro da sala de aula, para diminuir o estigma e preconceito em relação à saúde mental”, afirma Karen.

A especialista destaca outras ações importantes que os gestores e professores podem aplicar:

Você também pode fazer sua parte, jovem

Atenção, se você desconfiar que algum amigo não está legal, chame ele para uma conversa, se coloque à disposição sem ser invasivo e pergunte se ele se sente confortável para contar o que está acontecendo. Ofereça a sua escuta e lembre-se que sua função não é resolver o problema, mas, sim, acolher a pessoa.  ele pode fazer duas formas primeira conversar.

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Se durante essa conversa, ou nas redes sociais, você descobrir que o seu amigo ou amiga está se machucando ou com pensamentos sobre morte, você não pode guardar segredo. Não é que você vai sair falando para todo mundo, mas é preciso incluir um adulto de confiança, que pode ser um professor ou um familiar, para te guiar sobre o que fazer.

“O ponto principal é não ficar passivo diante do sofrimento de uma outra pessoa. Se você não souber o que fazer, busque informação ou avise alguém”, alerta Karen.

Ninguém precisa sofrer sozinho. Se precisar conversar, ligue 188 ou acesse www.cvv.org.br, ou se perceber que um amigo está com pensamentos suicidas, você pode acolhê-lo e também indicar o CVV.

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