O caso da mulher que, em estado vegetativo, foi estuprada e deu à luz bebê
Teria a humanidade alcançado um novo nível de violência contra a mulher? O que sente uma pessoa em estado vegetativo ao ser estuprada?
Talvez você já tenha lido sobre essa história. Ou talvez não. Talvez você sinta medo, nojo, ira, pena. Talvez ela te cause um vazio tão grande que, lá no fundo, você não sinta nada. Independentemente da sua reação, você precisa saber que, recentemente, uma mulher foi violentada sexualmente em uma clínica de saúde no Arizona, nos Estados Unidos. A paciente se encontrava em estado vegetativo há mais de 10 anos, engravidou do estuprador e deu à luz sem ter nenhum tipo de acompanhamento pré-natal.
Tudo aconteceu na clínica Hacienda HealthCare, localizada na cidade de Phoenix. No dia 29 de dezembro, a paciente em questão entrou em trabalho de parto. Outros pacientes e até mesmo funcionários relataram que ela estava fazendo barulhos estranhos e, quando foram ver, estava parindo. O filho nasceu saudável, o que surpreendeu muitos médicos. Por estar em estado vegetativo, a gestação era de alto risco tanto para a grávida quanto para a criança, já que o feto podia não receber nenhum tipo de nutriente para seu desenvolvimento. Como a mãe estava em estado vegetativo, podia acontecer de o feto morrer dentro da barriga dela. Como as pessoas só tiveram conhecimento da gravidez praticamente quando o bebê nasceu, ninguém iria saber caso a paciente estivesse com um feto morto dentro de si – pelo menos, não até que algo de incomum acontecesse com ela.
Bill Timmons, CEO da Hacienda HealthCare, pediu demissão do cargo após o escândalo. O pai da vítima disse que se mostrou surpreso quando recebeu a notícia e que, definitivamente, vai cuidar do bebê com muito amor. “A família obviamente está indignada, traumatizada e em choque pelo abuso sexual e pela negligência de sua filha na Hacienda HealthCare”, divulgou publicamente John Micheaels, advogado da família.
No momento, investigações sobre o caso estão sendo feitas. A polícia está realizando testes de DNA para identificar o estuprador. Os funcionários da clínica que não colaborarem de prontidão com a coleta, vão receber uma intimação legal. Nenhuma exceção será feita. As autoridades também não dispensam a possibilidade de a paciente ter sido abusada sexualmente por um visitante. Apesar de um abaixo-assinado que está rolando online, com o intuito de fechar o centro de saúde, representantes da Hacienda HealthCare esclarecem que vão redobrar os cuidados com a segurança do local e colaborar com a resolução do assombroso caso.
Uma grave complicação desencadeada por um vírus causou os danos cerebrais na paciente quando ela ainda era uma criança. Quase uma década depois, a jovem se tornou novamente uma vítima, agora de um estupro. Não existe pior ou menos pior quando agressões sexuais estão em pauta, mas é impossível não questionar o quão cruel e vil deve ser a mente do homem que a estuprou dentro de uma clínica de saúde. “O estupro não é um ato sexual. É um ataque. Trata-se de vencer, de conseguir um objeto – e a mulher é objetificada neste caso. Trata-se de poder. E há também pessoas que sentem prazer com isso”, explicou a psiquiatra Sahika Yuksel em uma entrevista sobre estupro para a BBC em 2015.
Mas uma mulher em estado vegetativo menstrua? Sim. Conversamos com a ginecologista e sexóloga Dra. Nelly Kobayashi para esclarecer a dúvida. “O ciclo menstrual pode estar normal nessa situação, pois o dano cerebral que deixa a pessoa nesse estado ocorreu em outra região que não é aquela que regula o ciclo”, afirma a especialista. Para complementar a discussão, falamos com o neurologista Dr. Luciano Magalhães Melo. Ele esclarece que, na condição de estado vegetativo, a pessoa não tem nenhuma consciência do que está acontecendo. Isso desvalida alguns tipos de comentários desrespeitosos e machistas que foram feitos, do tipo: “Ah, pelo menos ela sentiu prazer, né?”. “Ela pode até sentir que está sendo tocada ou que está ouvindo algum barulho, mas ela não consegue fazer a distinção do que realmente está acontecendo(…) Ela não identifica a reação da dor, não sabe de onde ela vem nem exatamente o que está sentindo. Não dá nem para dizer que ela realmente sentiu as dores do parto“, esclarece o neurologista que também é colunista do jornal Folha de São Paulo.
O caso segue sendo investigado e não dá para romantizá-lo como algumas pessoas estão fazendo, ao celebrar a vida do nenê, dizendo que ele é um milagre e que, apesar de tudo, é preciso celebrar a vida. Uma mulher em estado vegetativo foi estuprada. Uma mulher que não tem consciência sobre o que acontece ao seu redor foi violentada sexualmente. Isso, definitivamente, não dá para ser celebrado.