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‘Mocinha, não’: precisamos acabar com os estigmas em relação à menarca

A sociedade ainda vê a primeira menstruação como emancipação e usa eufemismo para tratar do tema – e isso impacta muito as garotas.

Por Juliana Morales Atualizado em 4 nov 2024, 20h48 - Publicado em 4 nov 2024, 19h40
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chegada da primeira menstruação não marca apenas o início da produção hormonal cíclica, que seguirá até a menopausa. Para além da questão biológica, a menarca carrega um forte simbolismo na nossa sociedade, baseado em aspectos culturais e sociais, que impactam muito a vida de uma garota – a começar pela ideia de “virar mocinha”.

Ana Beatriz tinha 11 anos quando menstruou pela primeira vez. Ela estava em casa e, por isso, “foi tranquilo”, segundo ela. Mas a jovem conta que precisou lidar com avalanche de sentimentos que veio junto do processo biológico. “Eu chorei muito por medo de ‘virar mocinha’, odiava a ideia de crescer”, lembra, hoje, aos 18 anos.

Giovanna Veronez também tinha 11 durante sua menarca. Ela recebeu flores e chocolate do pai quando aconteceu, mas viu como “ato carinhoso”, sem constrangimento. Só que estranhou o comportamento das outras pessoas a sua volta. “Quando você menstrua as pessoas começam a te ver, ainda mais a família, como ‘mocinha’, mesmo você sendo muito nova ainda, aí você fica meio sem entender porque isso está acontecendo”, relata a jovem de 16 anos.

Os incômodos e receios vivenciados por Ana e Giovanna, na verdade, representam a história de tantas outras garotas que se deparam com os estigmas e tabus acerca da primeira menstruação e tudo que ela representa socialmente. “O ‘virar mocinha’ vem carregado do peso social de se tornar uma mulher e de reforçar esses papéis de gênero”, analisa Raíssa Assmann Kist, fundadora da Herself, empresa que tem a missão de trazer o aspecto social e político da menstruação para o desenvolvimento das mulheres.

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Essa cultura de tratar a primeira menstruação como uma emancipação da menina ignora e exclui que a menstruação é uma evolução natural do corpo. “É um sinal de saúde e de crescimento biológico, assim como perder os dentes de leite”, exemplifica Raíssa.

Vale lembrar que a primeira menstruação, conhecida como menarca, ocorre quando a menina chega ao período fértil, que alcança seu ápice por volta dos 20 anos e entra em declínio a partir dos 30. É como se o corpo estivesse dizendo que já está pronto para encarar uma futura gestação, mesmo que psicologicamente a garota não esteja.

Normalmente, ela ocorre entre os 10 e os 14 anos, e o corpo começa a dar alguns sinais que ficam mais intensos com a proximidade dela, como o aumento das mamas e dos pelos pubianos e nas axilas.

Fazer com que a primeira menstruação passe de um processo biológico para um grande ritual de passagem pode gerar limitações para as meninas, que deixam de se sentirem confortáveis para seguirem a vida como crianças ou apenas pré-adolescentes, param de brincar, praticar esportes, e passam a acumular mais responsabilidades dentro de casa.

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“Muitas vezes, as meninas, com apenas 9, 10, 11 anos são vistas como adolescentes ou jovens adultas, ao invés de serem vistas como crianças que já está menstruam”, diz Raíssa. 

“Mocinha”, não, pode dizer que eu menstruei

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Herself/CAPRICHO

Para quebrar esses tabus e estigmas, é preciso criar um espaço seguro e acolhedor para falar abertamente sobre menstruação. Para começar, é necessário parar de usar eufemismos, como ‘virei mocinha’ ou ‘estou naqueles dias’, para se referir à menstruação.

Essa, inclusive, é a intenção por trás da campanha “Mocinha, não. Pode dizer que eu menstruei!”, da Herself, em parceria com a CAPRICHO. Desmistificar esse discurso ajuda a naturalizar e deixar todo mundo mais à vontade para falar de menstruação. 

Esse diálogo aberto pode ajudar a combater a desinformação que cerca o tema. Como mostra o estudo “pobreza menstrual e a
educação de meninas”, realizado pela Herself e a Girl Up, no Reino Unido, quase metade das meninas (48%) sentem vergonha quando estão menstruadas.

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Na Índia, o conceito de menstruação é desconhecido para 71% das meninas até a menarca. Na Colômbia, 45% das meninas desconhecem a origem do sangue menstrual e 20% o considera sujo. E o Brasil não foge à regra.

Mariana Ribeiro, 18 anos, contou à CAPRICHO que ficou menstruada no seu aniversário de 14, enquanto estava na festa do pijama com suas amigas.

“Eu achei que eu tinha me sujado de tinta, então eu ia tomar banho o tempo todo. Até a minha mãe perceber que eu sai e entrava no banheiro e me perguntou o que estava acontecendo. No fim, minha mãe me ensinou como colocar absorvente, os diferentes tipos e ficou tudo bem”, completa. 

Raíssa defende que jovens e adultos falem de menstruação naturalmente, nomeando-a devidamente, para que novas gerações cresçam escutando sobre o tema e aprendam a tratá-lo também, sem vergonha ou constrangimento.

Então, garota, você já sabe: Mocinha, não! Pode falar que você menstruou.

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