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Caso Pieper Lewis: vítima é condenada por homicídio após matar estuprador

A Justiça dos EUA entendeu que a adolescente, uma garota de 17 anos, matou seu agressor, Zachary Brooks, em um momento em que ele não oferecia real perigo

Por Isabella Otto Atualizado em 15 set 2022, 10h49 - Publicado em 15 set 2022, 10h49
Mugshot de Pieper Lewis, uma jovem negra de 17 anos que foi condenada por matar seu estuprador
Polícia de Iowa/Divulgação

Uma decisão tomada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Iowa, nos EUA, nesta semana, está dando o que falar. O juiz David Porter condenou Pieper Lewis, de 17 anos, a cinco anos de liberdade condicional e multa de US$ 150 mil (cerca de R$ 780 mil) por matar seu estuprador, Zachary Brooks, de 37.

Caso a jovem viole alguma das regras da condicional, ela pode pegar até 20 anos de prisão pelos crimes de homicídio involuntário e lesão corporal.

O dinheiro da indenização deverá ser pago para a família do estuprador, que, de acordo com a Justiça, foi lesada pela morte de Brooks.

Leland Schipper, um ex-professor da adolescente, está organizando uma vaquinha online para arrecadar dinheiro para ajudar a norte-americana a pagar a multa, para ele, injusta: “Pieper não deve justiça à família daquele homem. Ela não merece ficar sobrecarregada pelo resto de sua vida porque Iowa escreveu uma lei que não dá aos juízes qualquer poder sobre como ela é aplicada. Esta lei não faz sentido em muitos casos, mas neste caso, é moralmente injustificável”, escreveu na petição.

ENTENDA O CASO

Pieper Lewis vivia em um lar tóxico e sofria abusos da própria mãe. Aos 15 anos, ela decidiu fugir de casa para dar fim ao seu tormento – mas outro teve início.

Durante seu período de sem-teto, a garota foi abordada por um homem chamado Christopher Brown, na época, com 28 anos.

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O rapaz seduziu a jovem e a fez pensar que eles estavam namorando. Só que, na realidade, Brown era um aliciador e Lewis acabou sendo vítima de tráfico sexual.

Por diversas ocasiões, a adolescente foi “comercializada” pelo cara que até então ela achava que estava ajudando-a. Pieper era obrigada a ter relações sexuais com estranhos, a consumir álcool e drogas, e chegou a ser dopada várias vezes, quando, desacordada, tinha seu corpo estuprado.

Um dos clientes de Christopher Brown era justamente Zachary Brooks, que foi morto por Piper em 1º de junho de 2020.

A adolescente contou para a Justiça que estava sendo estuprada pelo homem há semanas, além de ser constantemente ameaçada e dopada.

Numa noite, Piper acordou e, ainda meio grogue, percebeu que Zachary dormia ao seu lado. Foi quando ela decidiu agir.

A vítima pegou uma faca e desferiu 30 golpes contra seu estuprador. Apesar da versão da jovem não ser contestada pela Justiça, que garante ter encontrado provas de que ela realmente foi uma vítima do tráfico sexual humano, o juiz David Porter entendeu que Zachary Brooks foi morto enquanto dormia e, consequentemente, em um momento que não representava perigo imediato à vítima, que foi condenada.

“Isso significa que eu enfrento estupro, abuso, ódio, manipulação, abandono, perda dos meus pais e solidão”, desabafou a adolescente, que é uma menina negra.

FAZ PARTE DA ESTATÍSTICA

Uma pesquisa realizada pela Fundação Congressional Black Caucus mostra que, nos EUA, 40% das vítimas de tráfico sexual são mulheres negras.

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Essa parcela da população também é a mais suscetível a crimes de violência contra a mulher, uma vez que se encontra às margens da sociedade e em situações de vulnerabilidade causadas pelo racismo estrutural.

Vale lembrar que a segregação racial nos Estados Unidos só teve oficialmente fim em 1964, quando o então presidente Lyndon B. Johnson assinou a Lei de Direitos Civis que decretou o fim do regime.

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Além de no tempo histórico a data ser bastante recente, na prática, o racismo no país continua fazendo vítimas diárias, que sofrem com a opressão, a falta de oportunidades, o preconceito, a violência policial, a discriminação e a falta de amparo do sistema judicial.

O CASO CYNTOIA BROWN

A história de Pieper Lewis é, em muitos momentos, semelhante a de Cyntoia Brown, que, aos 16 anos, recebeu a pena de prisão perpétua por matar o homem que a escravizava sexualmente, um cafetão conhecido pelo apelido de “Corta Gargantas”.

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Uma publicação compartilhada por Cyntoia Brown Long (@cyntoiabrownofficial)

Depois de muito protesto e muita luta, e após passar 15 anos presa, Cyntoia teve sua condenação revista pelo Governador do Tennessee, Bill Haslam, em 2019, e foi libertada após clemência.

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Ela, contudo, só ficará oficialmente livre em 2029, quando sua condicional de 10 anos enfim chegar ao fim.

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