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Amar é revolucionário e quem me ensina isso é bell hooks

Apesar de ser um substantivo, para ela o amor deve ser compreendido como verbo

Por Roberta Gurriti, colunista da CH Atualizado em 29 out 2024, 18h19 - Publicado em 16 set 2023, 16h11
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á faz um tempo que venho pesquisando sobre amor e como nós, pessoas pretas, pensamos e o vivenciamos na prática. bell hooks, escritora, filósofa e feminista norte-americana, diz que “quando nós, mulheres negras, experimentarmos a força transformadora do amor em nossas vidas, assumimos atitudes capazes de alterar completamente as estruturas sociais existentes”.

Forte, né? Parte dessa afirmação dela, que é fruto também de uma pesquisa, está em seu livro Tudo sobre o amor: novas perspectivas (Elefante, 2021); Amazon, R$45*. Ela afirma que, quando experimentarmos ao amor, de fato, “poderemos acumular forças para enfrentar o genocídio que mata diariamente tantos homens, mulheres e crianças negras” e que, com isso, será possível enxergar o passado com outros olhos”, além de transformar o presente e sonhar o futuro.”

Mas hooks também é super realista e joga a real: as mazelas do sistema escravocrata impactaram (e ainda impactam) nossa forma de amar e que, para contornar esse cenário, precisamos reconhecer que a opressão e a exploração distorcem e impedem nossa capacidade de amar. Forte, né?

Quando parei para pensar sobre os efeitos que o racismo provoca o amor, me veio à cabeça o quanto as mulheres e meninas pretas são carentes desse afeto. Bárbara Carine, idealizadora da Escola Maria Filipa – a 1ª escola afro-brasileira infantil -, uma vez escreveu que muitos homens pretos que ascendem social e economicamente tendem a deixar suas companheiras negras e começar relacionamentos com mulheres brancas. Pois é.

Existem muitos exemplos que eu posso dar sobre esse assunto. Mas o ponto é: por muito tempo nós consumimos produtos culturais, séries, filmes, livros, em que o amor preto, mesmo que interracial, era praticamente inexistente. Homens, mulheres, adolescentes negros não eram protagonistas de histórias de amor ou de conto de fadas e isso influencia, sim, em como enxergamos o “final feliz” e/ou “o amor verdadeiro”.

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O que é o amor, afinal?

para bell hooks, quando pulverizamos seu significado, ficamos cada vez mais distantes de entendê-lo.

Neste livro, primeiro volume de sua Trilogia do Amor, a autora procura elucidar o que é, de fato, o amor, seja nas relações familiares, românticas e de amizade ou na vivência religiosa.

Na contramão do pensamento corrente, que tantas vezes entende o amor como sinal de fraqueza e irracionalidade, bell hooks defende que o amoré mais do que um sentimento – é uma ação capaz de transformar o niilismo, a ganância e a obsessão pelo poder que dominam nossa cultura.

É através da construção de uma ética amorosa que seremos capazes de edificar uma sociedade verdadeiramente igualitária, fundamentada na justiça e no compromisso com o bem-estar coletivo.

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Eu mesma, por exemplo, nunca achei que esse amor era para mim. Sou filha de pais separados e, até os meus 13 anos, minha mãe nunca tinha casado novamente ou se envolvido com alguém. Tudo o que eu conhecia era o amor de mãe.

Sem mencionar o quanto meninas negras como eu, frequentemente são consideradas as “mais feias da sala” ou a ponte para os meninos poderem chegar até a amiga branca. Nunca éramos as garotas no topo da lista de alguém – eu não era e muitas outras pessoas compartilham o mesmo sentimento – e isso frustrou as nossas expectativas sobre o amor.

Neusa Santos Souza, psiquiatra, psicanalista e escritora brasileira, pontua que, “saber-se negra é viver uma experiência de ter sido massacrada em sua identidade, confundida em suas perspectivas, submetida a exigências, compelida a expectativas alienadas. Mas é também e, sobretudo, a experiência de comprometer-se a resgatar sua história e recriar-se em suas potencialidades”.

Muita gente diz que amor não tem cor, que todos amam baseado no afeto, na paixão, na atração mas, o que estes podem dizer sobre afetos sendo negados a pessoas pretas por ser quem são? Conheci muito da afetividade entre pessoas pretas quando comecei o meu relacionamento com um homem preto – hoje namoro há 4 anos – e convivendo com a família dele.

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Apesar da minha família também ser inteira preta, não é como a dele que vive suas raízes e ascestralidade. Foi ali que entendi um pouco mais sobre as vivências de pessoas pretas. E achei o máximo ver a maioria deles morando em vários países, com qualidade de vida e cultivando suas raízes mesmo em países europeus. Me deu uma outra perspectiva.

bell hooks, mínuscula, mas gigante

bell hooks morreu aos 69 anos em dezembro de 2021 e foi uma das escritoras mais importantes da sua geração e inspirou a nossa, viu?

hooks, que nasceu Gloria Jean Watkins, publicou seu primeiro livro de poemas “And There We Wept” sob seu pseudônimo em 1978.

O nome artístico, escrito inteiramente com letras minúsculas, era uma homenagem à sua bisavó e uma forma de driblar hierarquias estéticas da linguagem.

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Para bell hooks, o amor é uma ação. E, apesar de ser um substantivo, deve ser compreendido como verbo. A vontade de se empenhar ao máximo para promover o próprio crescimento espiritual ou o de outra pessoa. Dentro da chamada “trilogia do amor”, estão outros livros como “Salvação: Pessoas Negras e Amor”, 2001 e “Comunhão: A Busca Feminina pelo Amor”, 2002; com eles, ela nos mostra suas teses sobre o tema e, mais do que isso, nos oferece lições práticas de como agir.

O amor como ação é responsabilidade, comprometimento, sinceridade e comunicação. bell hooks me ensina que, se estamos amando, devemos expressar cuidado, afeição, respeito e confiança. Uma vez eu li que “nós, negros, temos a obrigação ancestral de sermos felizes”, e isso me pegou muito. Não é como se você não pudesse ser infeliz mas, sim, sobre ter a opção de ser feliz, há tempo tempo negada para nós.

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