
Promover a dignidade menstrual todos os dias é lutar pela vida das meninas
Precariedade menstrual vai além da falta de absorvente: ela traz impactos duradouros, como evasão escolar e problemas de saúde mental.
m um país onde 15 milhões de pessoas vivem em situação de vulnerabilidade menstrual, cada pequeno avanço conta. O último relatório governamental trouxe números que merecem nossa atenção: 2,1 milhões de pessoas foram beneficiadas com o programa de distribuição de absorventes no último ano.
O programa distribuiu 240 milhões de absorventes, representando, em média, 114 absorventes por pessoa ao ano — ou seja: pouco mais de um pacote por mês. Mas a pergunta que fica é: isso é suficiente?
A resposta parece clara quando olhamos os impactos reais. Segundo o Instituto Locomotiva, 5,5 milhões de trabalhadoras já faltaram ao trabalho por não terem condições de comprar absorventes.
Nas escolas, o cenário não é diferente: 321 mil estudantes frequentam instituições sem infraestrutura sanitária adequada, sendo que 121 mil dessas estudantes estão concentradas no Nordeste.
A precariedade menstrual vai além da falta de absorvente e do acesso à saúde básica. Ela traz impactos sérios e duradouros: faz com que muitas pessoas faltem na escola, percam dias de trabalho, tenham a saúde física e mental afetada e enfrentem dificuldades nas relações com outras pessoas.
Ainda, sim, existem iniciativas que mostram que é possível agir. O MenstRUA, nascido no coração da Amazônia, combate a pobreza menstrual por meio de rodas de conversa, oficinas educativas e distribuição de kits menstruais, com foco especial em pessoas em situação de rua. O projeto demonstra como é possível criar impacto mesmo em regiões desafiadoras do país.
Em outra frente, há também o Mutirão Simplifica, que vai além da distribuição de absorventes, atuando de forma integrada ao facilitar o acesso a documentos básicos e conectar pessoas em vulnerabilidade aos serviços públicos.
Já em Porto Alegre, o coletivo Garotas de Vermelho mostra o poder da juventude na liderança de mudanças significativas. Através da produção de absorventes de pano, criação de material educativo e publicação de um livro colaborativo, o grupo envolve meninas e meninos em discussões fundamentais sobre saúde menstrual.
A dignidade menstrual não é uma questão de gênero isolada — é uma questão de direitos humanos fundamentais.
Também vale citar iniciativas que apostam na educação como caminho pra transformação. Uma delas é a Escola da Menstruação, da Herself Educacional — da qual faço parte como educadora menstrual desde o início. Criada em 2019, ela surgiu com o objetivo de garantir acesso a informações seguras sobre menstruação e construir novas narrativas sobre o tema. Desde então, os cursos, livros e vivências já chegaram a mais de 12 mil pessoas em 15 países.
Hoje, também atuamos com jornadas educativas em instituições penais femininas, unindo educação menstrual, saúde e capacitação profissional. Essas iniciativas são fundamentais — mas ainda não dão conta do tamanho do problema. Quando olhamos para o ritmo atual dos programas e lembramos que 15 milhões de pessoas ainda precisam de suporte, fica claro: precisamos acelerar e ampliar as políticas públicas existentes.
A dignidade menstrual não é uma questão de gênero isolada — é uma questão de direitos humanos fundamentais. Os avanços são importantes, claro. Mas a verdade é que ainda estamos longe de garantir dignidade menstrual para todo mundo que menstrua no Brasil. E isso precisa mudar.
Não dá pra deixar esse assunto só para o mês de maio. A menstruação acontece todo mês — e a luta por dignidade também. A gente precisa manter essa conversa viva, cobrar políticas públicas que façam sentido e garantir que esse caminho seja sem volta. Porque dignidade menstrual é um direito.
Quem está lendo essa coluna na CAPRICHO e está menstruada, hein? Tenho certeza que muitas e muitos de vocês aí do outro lado passam por isso. E, para vocês, fica o convite para se juntar a essa luta por um futuro onde a dignidade menstrual seja realidade para todas as pessoas.