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Gautier Lee
Gautier Lee é uma roteirista-diretora queer negra. É uma das fundadoras do Macumba Lab, um coletivo de profissionais do audiovisual negro no Rio Grande do Sul. Escreve mensalmente para a CAPRICHO.
Gautier Lee
Gautier Lee é uma roteirista-diretora queer negra. É uma das fundadoras do Macumba Lab, um coletivo de profissionais do audiovisual negro no Rio Grande do Sul. Escreve mensalmente para a CAPRICHO.

Você merece assistir à uma série ou filme e se sentir representade nela

Em sua coluna de estreia na CAPRICHO, a roteirista Gautier Lee reflete sobre sua relação com produções audiovisuais na adolescência.

Por Gautier Lee 23 fev 2024, 06h00
C

omo se começa uma coluna? Eu tô tentando responder essa pergunta e várias ideias (a maioria ruins) vieram à minha mente. Começar me apresentando pareceu uma boa ideia. Mas de onde começar? Falo primeiro sobre o que gosto, sobre com o que trabalho ou sobre quem eu sou? Pera… Gostar. Trabalhar. Ser. Parece ser uma boa ordem, três atos dramáticos, meio poético até.

Meu nome é Gautier Lee e gosto muito de comédias românticas. E gosto mais ainda de romances adolescentes. Só que… Tenho 30 anos na cara, então eu sou constantemente subjugada pelos meus gostos. E disso, eu não gosto.

Desde criança eu sempre gostei muito de ler e, por consequência, escrever. E foi por isso que agora trabalho com o que eu trabalho: roteiro e direção de TV e cinema. E sim, é um trabalho tão legal quanto parece ser. Meu pai odiava que eu passasse todo o meu tempo livre assistindo TV e disse que “só quem ganha dinheiro com televisão é quem trabalha com isso”. Então decidi trabalhar com isso.

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Porém a descrença do meu pai não foi a única coisa que me incentivou. Em 2006, eu assisti, pela primeira de várias vezes, a maior obra-prima do cinema mundial: High School Musical. E ver o Troy e a Gabriella se apaixonando me fez querer escrever histórias de amor. E isso diz muito sobre quem eu sou: uma romântica incurável apaixonada pelo amor.

Assim, era levemente obcecada por romances durante a minha adolescência. Mas haviam duas coisas que me deixavam insegura quando eu pensava em viver meus próprios romances: 1) eu sou negra, e 2) eu sou uma pessoa trans. É uma experiência muito curiosa ser essas duas coisas ao mesmo tempo.

Todos os romances que eu assistia ou lia eram com personagens que pouco, ou em nada, se pareciam comigo. Era um tanto frustrante.

Decidi falar sobre isso aqui porque são duas das coisas mais importantes do meu ser, eu não consigo deixar de ser. E, pra piorar, não entendia e nem tinha assimilado nada disso na minha adolescência. Todos os romances que eu assistia ou lia eram com personagens que pouco, ou em nada, se pareciam comigo. Era um tanto frustrante.

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Mesmo com a existência de Chad e Taylor como casal em High School Musical, eu me descobri lésbica no ano seguinte ao lançamento do filme e o casal perdeu um pouco a graça. Logo depois veio Emily e Maya em Pretty Little Liars e eu fiquei obcecada pelo casal, mas ele acabou nas primeiras temporadas e isso me devastou. 

Tá tudo lá, só que com pessoas nas quais eu posso me ver e ver o meu eu adolescente também. Porque ela merece se ver. Todo mundo merece, inclusive você.

Gautier Lee

E quando me entendi uma pessoa não-binária, passei a buscar por personagens trans nas histórias que eu lia e assistia. Felizmente foi mais fácil de encontrar do que achei que seria. Um amigo me deu uma cópia de Felix Para Sempre e eu me apaixonei pelo Felix. E foi incrível a adição de Dua Saleh como Cal em Sex Education. Sem falar no Darren que entrega os melhores shades em Heartbreak High!

Dou um suspiro de alívio toda vez que lembro que esses personagens existem. Mais do que existir, eles vivem todas as dores e delícias de um romance. O meet-cute, o primeiro encontro, o primeiro beijo, a primeira vez, a primeira briga, a reconciliação e o final feliz. Tá tudo lá, só que com pessoas nas quais eu posso me ver e ver o meu eu adolescente também. Porque ela merece se ver. Todo mundo merece, inclusive você.

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