primeiro show que vi na vida foi dos Jonas Brothers. Camp Rock World Tour em 2010. O último que vi na vida também foi dos Jonas Brothers. The Tour em abril de 2024. Existem muitas diferenças e semelhanças entre esses dois acontecimentos marcantes na minha vida.
No primeiro, eu tinha apenas 17 anos, no último, 30 (aí, as costas doeram). O primeiro foi anos antes do término da banda, o último foi anos depois do comeback. No primeiro, a minha ex-namorada ganhou os ingressos inesperadamente em um sorteio de rádio.
No último, encarei duas horas de fila num sol escaldante depois de ter aberto conta no banco que estava fazendo a pré-venda. Mas nos dois assisti à performance ao vivo de Gotta Find You e Introducing Me. E entre diferenças e semelhanças, sempre houve um fator decisivo para que eu pudesse ver os irmãos Jonas ao vivo: a distância.
Hoje, com 30 anos, moro no Rio de Janeiro, trabalho e me sustento com o meu próprio trabalho e consegui, facilmente, comprar passagens e hospedagens para São Paulo a fim de ver o show. Mas com 17 anos eu morava com meus pais na minha cidadezinha no interior do estado e não tinha nem duas moedas de um real para esfregar uma na outra.
Não tinha pago nem pelo ingresso, como eu ia pagar pelos outros custos do show? A única solução foi juntar as moedas que sobravam dos lanches e das passagens, cancelar todos os rolês com amigos que fariam para juntar a grana e implorar, mas implorar mesmo, para os meus pais me deixarem ir no show. Porém, eles disseram não, e fiz o que qualquer adolescente de 17 anos com um par de ingressos gratuito para ver a banda pop favorita faria: eu fugi de casa.
Isso mesmo, você não leu errado. Fugi de casa por causa dos Jonas Brothers. Mas, se você, assim como eu, for um fã que morava ou ainda mora longe dos grandes centros, você vai me entender. Nem foi uma loucura tão grande assim. As passagens de ida e volta de ônibus custaram 60 reais e eu fiquei na casa dos pais da minha ex-namorada.
No sábado que aconteceu o show, peguei minha mochila, já previamente arrumada, e fui para a aula de espanhol como se fosse um dia qualquer. Depois da aula, caminhei até a rodoviária que ficava a 10 minutos de distância à pé, entrei em um ônibus para a capital e comecei a minha aventura.
O acesso à cultura e ao entretenimento no Brasil ainda é falho. E se não fosse tão falho nós teríamos mais Jonas Brothers, mais BTS, mais Beyoncé, entre outros nos entretendo anualmente.
Gautier Lee, colunista da CAPRICHO
Para a minha sorte, deu tudo certo. Assisti ao show, cantei, me emocionei, chorei, vivi a experiência completa que qualquer fã de qualquer artista musical gostaria de viver. E ainda assim, os fãs que conseguem ter essas vivências ainda são os que moram em grandes capitais, especialmente os paulistanos e os cariocas.
E daí eu me pergunto: e os soteropolitanos? E os manauaras? E os capixabas que mesmo morando no sudeste ainda tem que percorrer grandes distâncias por seus ídolos? E isso porque eu estou citando apenas os residentes em capitais. Você acha que um fã que mora em Xapuri/AC teria condições financeiras e logísticas de ir à The Tour em São Paulo?
Ser fã às vezes é um fardo. E um fardo ingrato. E às vezes é recompensador. Mas não podemos negar que, acima de tudo, é agoniante. São meses, às vezes anos, esperando por uma turnê que não chega na América Latina. São lágrimas infinitas quando não se consegue ingresso para o setor desejado. Isso quando se consegue ingresso.
O acesso à cultura e ao entretenimento no Brasil ainda é falho. E se não fosse tão falho nós teríamos mais Jonas Brothers, mais BTS, mais Beyoncé, entre outros nos entretendo anualmente. Ser fã ainda significa ser impulsionador de toda uma indústria que não existiria sem a gente e hora de que o mercado do entretenimento também entenda isso.